quinta-feira, 13 de outubro de 2016

UM CONCERTO DE BOB DYLAN


13 de Julho de 1993, andava eu perdido pelas colinas da capital há meia dúzia de meses. Falhar a oportunidade de assistir ao concerto de um dos meus ídolos estava fora de questão. Precisava de 4500€, consegui os 4500€. Dirigi-me à Bimotor, discoteca nos Restauradores onde comprei dezenas (centenas?) de CDs, e os olhos vidraram, o rosto transpirou, o coração palpitou quando me vi com o bilhete nas mãos. Inicialmente agendado para o Restelo, julgo que por falta de público acabou por ser transferido para o dramático de Cascais. A 1.ª parte do Sérgio Godinho desapareceu, sendo substituída por uma suposta 2.ª parte de Laurie Anderson. Referi-me a esse momento aqui, mas não contei o mais relevante. Durante a actuação de Anderson, grande parte do público manteve-se de costas voltadas para o palco. O ruído era imenso, a performance literária de Laurie estava a passar ao lado. Não dos meus sentidos, absolutamente concentrados e extasiados pela encantadora experimentação daquelas canções. Confesso que ganhei mais nesse dia com o concerto de Laurie Anderson do que com a prestação de Bob Dylan. Já numa fase trôpega de um percurso instável, Dylan mal se ouvia. A voz resumia-se a um imperceptível arrastar de sílabas, a acústica estava péssima, indisponível para harmónicas e, a espaços, verdadeiramente insuportável tal era a cacofonia. Mas Bob Dylan estava ali a dois ou três metros, para mais com um álbum acabado de editar que revisitava os bons velhos tempos da canção folk e dos blues. Ainda cá por casa no velho formato vinil, volto a escutar Good As I Been To You (1992) e sou surpreendido por uma canção intitulada Blackjack Davey. Trata-se de um entre muitos tradicionais norte-americanos que Dylan recuperou, desbravando terreno para que outros, depois dele, como os The White Stripes ou Elliott Smith, continuassem a fazer viver o que há de melhor no imaginário popular daquelas bandas. É neste sentido que podemos chamar-lhe um clássico sem ofender o que teve de inovador. Pessoalmente, como já afirmei noutras paragens, prefiro Leonard Cohen, Tom Waits ou mesmo Nick Cave enquanto escritores. São compositores onde a face literária está mais exposta. E em termos gerais de fusão entre a música e a palavra agradam-me mais as obras de Neil Young ou de Bruce Springsteen, embora seja sempre com agrado que regresso a Bob Dylan:


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