Delmer Daves (n. 1904 – m. 1977) assinou alguns westerns
relevantes, entre os quais 3:10 to Yuma/O Comboio das 3 e 10 (1957), com
direito a remake em 2007, talvez seja o mais conhecido. Mas antes dessa obra,
Broken Arrow/A Flecha Quebrada (1950), nomeado para três Oscars, é considerado uma
obra-prima da reabilitação dos índios nas telas de Hollywood. Jubal (1956) é um
outro belíssimo exemplo da inclinação de Delmer Daves para temas invulgares no
universo western. Baseado numa história de Paul Wellman, escritor com vasto
currículo na recriação literária do Velho Oeste, Jubal traz para o centro de
acção o problema da infidelidade conjugal. O argumento exibe várias influências
bíblicas, das quais o nome da personagem central é a mais evidente. No entanto,
o Jubal interpretado por Glenn Ford transcende a conotação bíblica para se transformar
numa verdadeira personagem trágica. Por um lado, sente-se obrigado pelo dever
de fidelidade ao melhor amigo. Por outro, é tentado pela mulher desse amigo. No
caldo do conflito, acaba por se afundar num pântano de traições, de ciúme e de inveja
com o qual pouco tem que ver.
Vítima das circunstâncias, Jubal não se mantém desde o
início inabalável nas suas convicções. Isso só acontecerá quando aprende a deixar
de fugir do passado, do azar que o persegue, e se concentra em viver uma vida
de verdade. Neste sentido, é um típico herói do western norte-americano. Mas o
interesse de Jubal não está apenas na elevação do seu herói. A personagem interpretada
por Valerie French justificaria por si só o filme. Mae Horgan é o símbolo da
tentação numa quinta que poderia ser a terra prometida não fosse antes um
inferno humano. Casada com Shep Horgan, o homem que acolhe Jubal Troop rapidamente
o promovendo a capataz, Valerie deixou o Canadá em busca de uma vida próspera
que nunca alcançou. O casamento com Shep revelou ser mais um passo a caminho
do tédio. Valerie trai Shep com ‘Pinky’ Pinkum, o ambicioso cowboy da quinta de
Shep que vê o lugar de capataz lhe fugir com a chegada de Jubal. Mas ‘Pinky’
também verá fugir-lhe Valerie, a qual passará a tentar junto de Jubal a
história de uma paixão que nunca passará de sonho e de intenção.
A história de Jubal é, pois, a história de um homem só.
Invejado por ‘Pinky’, desejado pela mulher do melhor amigo, acusado de traição
por Shep, resta-lhe confiar na infiel Valerie para escapar a um linchamento
público engenhado pelo seu principal inimigo. Mas Valerie não está menos só.
Ela trai Shep com ‘Pinky’ e trai ‘Pinky’ com Jubal, traindo-se, sobretudo, a si
própria sempre que nos braços de Shep aceita uma vida que nunca desejou. Ela
ainda não aprendeu a enfrentar o passado, carrega-o como um fardo arrastando-o
pelo presente. O fim trágico adivinha-se-lhe. Não como expiação, nem como
sacrifício. A infidelidade de Valerie não é sequer julgada neste filme segundo
padrões ancestrais que porventura à época seriam menos estranhos ao público do
que hoje são certos acórdãos judiciais. Também a jovem Naomi Hoktor, filha do
pregador de uma caravana parqueada nas terras de Shep Horgan, se apaixona por
Jubal apesar de já estar prometida a um outro jovem. O fim trágico de Valerie é
o fim de uma mentira da qual a sua própria vida é a expressão mais severa.
Jubal não é um western moralista, apesar do tom melodramático
e do carácter humanamente inabalável do herói que lhe deu nome. É antes um
filme que eleva a verdade a valor absoluto, colocando em personagens capturadas
numa teia de mentiras e de infidelidades várias o desafio último de ou serem
verdadeiras, e sobreviverem, ou insistirem na mentira, e acabarem mais mortas
do que já estavam nas suas vidas insignificantes.
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