segunda-feira, 27 de agosto de 2018

AMORES DE VERÃO #4


HUMAN BULLET

     Todo o poeta tem um quê de entertainer.
     Todo o entertainer tem um quê de entristecido.

Dada a tendência a despachar o que é inútil,
nos cercos de antigamente
catapultavam-se cadáveres de soldados.
Não é apenas uma arma biológica,
é propaganda perfeita do inevitável.
Decomposição mais gravidade.

Aninha-se o eco do horror, sem que saibamos, nos circos.
O homem que entra no canhão costuma vestir vermelho.
O vermelho é a farda do risco.
Pedir silêncio torna-se divertido, se pensarmos nisso,
jaulas com macacos e tigres. Depois,
a contagem decrescente. Raramente favorece o arrepen-
dimento,
é uma espécie de chicote para o drama.

Quando és projectado a tal velocidade, passam-se coisas nas
células, sai-te oração pelo nariz, é
tão embaraçoso, como mijar em público.

O resto do voo é-me indiferente, tal como a aterragem.
Segue-se quase sempre música. O Fortuna.
Já sofreu tanto essa canção. Alguém,
por fim, que a salve,
                        com uma bala na nuca.


Yannis Stiggas (n. Atenas, Grécia, 1977), in Exupéry significa perder-se, trad. José Luís Costa, Douda Correria, Abril de 2018, s/p. 

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