quarta-feira, 21 de novembro de 2018

CAMPO DE TRIGO COM CORVOS




Porque há que aproveitar até ao final do fogo
            aquele que sempre quis aquecer o submerso
e a tristeza atinge o ponto
            que afugenta o espírito e aliena a mão,
pinto com estertores.

Dentro do Ser único
sob o longo pressentimento azul
quero traçar um longo caminho duplo
                                                                  vermelho acaso
quero soltá-lo assim fluindo entre canções verdes
     quero estender
                         ardor imenso reinando e ressoando
o salmo o ouro vitorioso da vida

Logo o vento é anátema
a solidão retorce-se
a obscuridade assalta
surge infinito da medula
                              o negro
                              foge perverso traidor…
Apavorado
o enorme amarelo intromete-se oblíquo rebentando.

O negro aberto em vis asas
               ronda o espanto candente
                        sobe cresce extermina céu
foge a estrada cárdea
       foge de revés seu duplo uivo verde
               foge o espaço a saída a razão
não posso deter os corvos…


Amelia Biagioni (n. 1916 – m. 2000), versão de HMBF. Professora de literatura em Gálvez, mudou-se para Buenos Aires em 1955. Foi amiga de Alejandra Pizarnik e de Olga Orozco. Começou a publicar poesia sob pseudónimo, em jornais e revistas, passando a usar o nome de baptismo apenas na década de 1950. O primeiro livro surgiu em 1954: Sonata de soledad. Discreta, esquiva, acabou por publicar apenas sete livros. Estaciones de Van Gogh (1984) foi um deles.

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