terça-feira, 30 de abril de 2019

PIADAS DE MAU GOSTO


O maior desafio que o humor nos coloca é o de percebermos até que ponto estamos disponíveis para aceitar o exercício livre da falta de bom gosto. Não posso indignar-me com uma piada quando ela atinge os meus valores, julgando que os outros não se devam indignar quando os seus valores são atingidos. Há piadas que não têm piada alguma, mas são piadas. A agitação em torno de uma sátira na Faculdade de Direito de Lisboa é bem ilustrativa de certa incoerência, sobretudo se pensarmos nas reacções que mereceram o jogo de atirar cocó à cara de um juiz, exibido por Ricardo Araújo Pereira no seu programa de humor, várias piadas de Rui Sinel de Cordes, as sátiras a Maomé do Charlie Hebdo, algumas caricaturas de António, etc, etc, etc. Se o princípio for o da inexistência de limites para o humor, e eu defendo esse princípio até à última das consequências, então tenho de conseguir aguentar quando julgo não haver piada alguma numa piada. Voltamos ao mesmo: posso não achar piada alguma à sátira que alguns alunos da Faculdade de Direito fizeram e tanto incómodo tem causado, ma isso não legitima minimamente um discurso de ódio a esse tipo de humor. Muito menos quando generaliza a toda a faculdade o gesto isolado de um grupo específico. Parece-me muito mais censurável esse discurso, pelo tipo de raciocínio que o fundamenta, do que a piada em si. Que, bem vistas as coisas, é só mais uma piada de mau gosto.  

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