O maior desafio que o humor nos coloca é o de percebermos até que ponto estamos disponíveis para aceitar o exercício livre da falta de bom gosto.
Não posso indignar-me com uma piada quando ela atinge os meus valores, julgando
que os outros não se devam indignar quando os seus valores são atingidos. Há
piadas que não têm piada alguma, mas são piadas. A agitação em torno de uma
sátira na Faculdade de Direito de Lisboa é bem ilustrativa de certa
incoerência, sobretudo se pensarmos nas reacções que mereceram o jogo de atirar
cocó à cara de um juiz, exibido por Ricardo Araújo Pereira no seu programa de
humor, várias piadas de Rui Sinel de Cordes, as sátiras a Maomé do Charlie
Hebdo, algumas caricaturas de António, etc, etc, etc. Se o princípio for o da inexistência de limites para o
humor, e eu defendo esse princípio até à última das consequências, então tenho
de conseguir aguentar quando julgo não haver piada alguma numa piada. Voltamos
ao mesmo: posso não achar piada alguma à sátira que alguns alunos da Faculdade
de Direito fizeram e tanto incómodo tem causado, ma isso não legitima minimamente um discurso de ódio a esse tipo de
humor. Muito menos quando generaliza a toda a faculdade o gesto isolado de um
grupo específico. Parece-me muito mais censurável esse discurso, pelo tipo de
raciocínio que o fundamenta, do que a piada em si. Que, bem vistas as coisas, é
só mais uma piada de mau gosto.
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