DÉCIMA TERCEIRA CANTIGA DE AMIGO
A minha amiga em migalha
um dia se transformou.
Procurei-a onde não estava:
uma cigarra cantava,
uma formiga a levou.
Logo outra amiga tomei
que o todo o pão esmigalhava
fosse o pão para os pedintes
fosse pão branco de rei
— todo o miolo migava
e toda a côdea também.
Da minha amiga antiga
cada migalha é presença
e todo o pão ela pensa
à massa de mim me obriga.
Mastigando a vou seguindo
até que um dia consiga
sair do estreito carreiro
entre a cama e o celeiro
escolhendo um labirinto
à escala de uma formiga.
E como um dia lhe disse
serei o que não serei
e quem fui serei também
ao invés de uma velhice
ao invés da mocidade
porque esse amor que farei
terá no pão seu vulcão
seu sabor e qualidade.
Regina Guimarães, in Cantigas de Amigo/Lady Boom - as rainhas, Hélastre, 2009, pp. 17-18.
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