\história exemplar
Por motivo de força maior, vou dar-vos um exemplo.
Uma vez um exemplo fugiu de casa, isto é, fugiu da coisa que queria exemplificar. Andou perdido, perdido pelo bosque que serve de exemplo a todos os entes que andam perdidos nas histórias, sem saber que coisa exemplificava. Como estava separado da coisa que exemplificava e tinha, em consequência, o potencial de exemplificação reduzido ao mínimo, sentou-se para descansar. Talvez assim este exemplo fosse encontrado e adoptado por uma outra coisa. Porém, assim não aconteceu.
Até que surge no bosque, pelo caminho de onde o nosso exemplo estava à beira, a descansar, um outro exemplo, também perdido, já completamente sem capacidade de exemplificar o que quer que fosse. Os dois exemplos não se conseguiram apresentar, como é óbvio, mas, como bons exemplos que eram, puseram-se logo na conversa. Horas e horas a fio. Era já quase noite e no meio de tantas histórias e coisas que durante tantas horas exemplificaram, sentiram-se tão identificados que encontraram finalmente a coisa (que era a mesma) que afinal ambos exemplificavam.
António Pocinho, in Os pés frios dentro da cabeça, Fenda, Dezembro de 1999, p. 31.
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