segunda-feira, 2 de janeiro de 2023

VITO ACCONCI (1940-2017)

 


Uma câmara fixa filma-me, de corpo inteiro, de pé com os olhos vendados e as costas voltadas para a parede: fora do enquadramento, bolas de borracha são atiradas para cima de mim, uma de cada vez, repetidamente. Tento apanhar a bola que não vejo... Levanto os braços em frente do meu rosto, prevejo onde a próxima bola irá parar, engano-me, os meus movimentos são em vão... Sou atingido por uma bola, o meu corpo dobra-se para a frente, é tarde de mais para me proteger...
 
Em oposição à representação pictórica, as performances reclamam uma presença em termos de espaço e tempo: o Aqui e Agora da proximidade. Intérprete e público estão presentes ao mesmo tempo no mesmo espaço. Nessa base, as duas partes são muitas vezes consideradas interactivas: cada uma toma mutuamente o lugar do Intérprete/público. Por outro lado, em aparente contradição com a questão da presença, praticamente todas as performances são registadas em fotografia, filme ou vídeo, para poderem ser mais tarde visionadas em contextos diferentes. Desse modo cria-se uma situação paradoxal de "proximidade mediada". Em Three Adaptation Studies: Blindfolded Catching, Vito Acconci produz uma performance "só para a câmara". Por conseguinte, não havia público presente na altura das filmagens. Quem assistir mais tarde, seja quando for, à projecção do filme, não sabe quem é que estava a atirar as bolas de borracha nem qual era exactamente a sua intenção. Acconci usa aqui o vídeo como dispositivo para questionar a noção de "presença" e "interactividade" na performance. Poder-se-ia dizer que o intérprete tem como objectivo (re)conquistar o estatuto mítico de artista fazendo o papel da vítima típica que é sujeita a uma fonte desconhecida de violência - usando, mesmo, uma referência oculta ao sofrimento de Cristo.
 
In A Obra de Arte sob Fogo. Inovações Artísticas 1965-1975, editado por Ulrich Loock, Fundação de Serralves e Jornal Público, 2004.

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