Um país de emigrantes que detestam imigrantes, de
católicos não praticantes, de esqueletos no armário, de telhados de vidro, de
gays tristes, de poetas deprimidos, de suicidas octogenários, de estrelas
cadentes, de novos ricos, de abnegados proprietários e de papas despojados, de
doutores, de engenheiros, de licenciaturas administrativas e teses plagiadas,
de tops e de tangas, de independentes institucionalizados, de gajos mesmo fixes
e de gajas do caralho, de anarquistas medalhados, de grandes, enormes, gigantescos
e ofuscantes artistas anónimos, da mania das grandezas e dos complexos de
inferioridade, de amigos do seu amigo, de tios, de tias, de madrinhas, de
padrinhos, um país americanizado, sem memória, rendido, uma ex-potência
colonial boazinha, uma ditadura assim assim, uma dentadura falsa, uma história
gloriosa de falências sucessivas, uma constituição para inglês ver, leis por
aplicar, um país que adia até prescrever, o país dos recursos, das amnistias,
dos investimentos parados, das obras embargadas, indeciso, logo se verá, haja
saúde, um dia de cada vez, um país de cidadãos sem cidadania, de pântanos sem
fim, de sindicatos profissionais (para quando o sindicato dos sindicatos?), de
profissionais amadores, de políticos que não são políticos, de sistemas
antissistema, de coisas em forma de assim, de enteados, de cães abandonados, de
trabalhadores colaboradores, de patrões investidores, de fundos e de fundões,
de atropelamentos e fuga, de touradas limpas, de pulseiras electrónicas e
prisões domiciliárias, de pirómanos condecorados, de incêndios e inundações, de
praias poluídas, de amantes da natureza, de surfistas da banheira, o país dos
projectos, das feiras, dos festivais, das festas, dos arraiais, o país do
interior abandonado, dos sucateiros, dos conceitos, dos concursos, dos prémios,
das comissões, das passadeiras vermelho desbotado, do hino, das marchas, das
procissões.
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