terça-feira, 1 de julho de 2025

O MEU SILÊNCIO

 
O meu silêncio não funciona
ronrona como um gato
respira fundo
vibra
anda pelos telhados
em miados vigorosos
 
O cio do meu silêncio
não se poupa a esforços
tem ego inflamado
Silente como um zumbido
é a voz do meu silêncio
 
Pode ser livre
se for à minha maneira
pode actuar
desde que como eu queira
pode quebrar-se
conquanto se mantenha calado
 
Porque o meu silêncio
tem vontade própria
está avariado
E numa estática constante
de imagens ruidosas
rouba-me o sono
leva-me à praia
leva-me para bem longe de mim
num peito em floração
de ruídos
indesejados
 
O meu silêncio
por mim silenciado
faz barulho pela calada
reúne-se com o futuro
diz que sim para não
manipula
adultera
exerce pressão
 
O meu silêncio esmera-se
entre sístoles e diástoles
de elipses
arritmias
rimas
espartilhos
 
Bato-me com ele
gargalho com estrépito
porque me foge e se liberta
 
É esquivo como o futuro
evasivo
intratável
desdenhoso do presente
o meu silêncio avariado
 
Tem vida própria
o meu inadmissível silêncio
Dou-lhe um ramo de túlipas
devolve-me espirros
 
É alérgico à voz dos outros
assobia para dentro
não tem fora
todo ele é na primeira pessoa
 
À noite mede a pressão
toma o comprimido
dorme mal
 
O meu silêncio não funciona
não liga
nem desliga
é traiçoeiro e desleal

Sem comentários: