Sempre que ouço falar no orgulho em ser português
lembro-me de Francisco Xavier de Oliveira, que no século XVIII falava disto
como um relógio atrasado pela Inquisição. Não tenho orgulho em ser português
porque só me orgulho do que faço, ter orgulho em ser português é tão ridículo como
ter orgulho em ser homem. Calhou assim, por azar ou por sorte. Sei que gosto de
Portugal, um pequeno país com uma longa história, repleta, como todas as longas
histórias, de factos admiráveis e de outros escabrosos. Ando pelo país e admiro
a diversidade do território e das respectivas tradições, alicerçadas numa
miscelânea de culturas que, estou certo disso, a maioria dos portugueses
desconhece. De resto, o maior vício de Portugal é mesmo a incultura dos
portugueses. Já Almada Negreiros o denunciava, e com toda a razão. Veja-se esta
conversa em torno da nacionalidade, o crescente discurso de ódio contra a
imigração num país que sempre foi de emigrantes e andou a espalhar sémen pelos
quatro cantos do mundo, um país que exibe nos subterrâneos do metro frases
icónicas de filósofos clássicos - "Não sou ateniense nem grego, mas sim um
cidadão do mundo". - pelas quais os portugueses passam como cães por vinha
vindimada. Depois de termos sido mouros, andámos a copiar espanhóis (já agora,
o espanhol foi a língua da nossa corte durante séculos), depois copiámos os
italianos, depois os franceses, os ingleses, os alemães. Sempre a reboque do lá
fora, cá fomos fazendo a nossa vida dentro discutindo se há uma filosofia
portuguesa ou apenas filosofia em Portugal. Eu cá acho que há muita desmemória,
pouca educação e, por consequência, uma falta de civismo gritante que redunda
em números impressionantes de sinistralidade rodoviária, violência doméstica,
grunhice por metro quadrado e num culto da chico-espertice e da hipocrisia -
herança católica - que faz de nós, os portugueses, um povo desmerecedor das
variantes de bacalhau encontradas de norte a sul do país. Portanto, não me
venham cá com o orgulho em ser português, que o José Sócrates, o Joe Berardo, a
Dona Branca, o Duarte Lima e a Rosa Grilo também são. Eu estou cada vez mais
com o saudoso João César Monteiro: "Não vogando já na doce ilusão de uma
sociedade sem classes, concordei em aceitar viver numa sociedade sem
classe." De preferência, à distância. De mim e dos outros, acrescento.
Sem comentários:
Enviar um comentário