sexta-feira, 27 de maio de 2005

FIGURAS DO MUITO OBSCURO

Pesquisando um pouco sobre Yves Namur (poeta belga, nascido em 1952) facilmente nos apercebemos que Figures du très obscur (2000) é uma das suas obras mais conceituadas, à qual se deverão juntar Fragments de l’inachevée (1992) e Le livre des apparences (2001). Agora traduzido para português, por Fernando Eduardo Carita, chega às bancas pela Cavalo de Ferro e com prefácio de Nuno Júdice. O prefácio, breve e justamente intitulado O Esplendor do Essencial, pareceu-me bastante exacto: «é uma poesia que vive no ponto mais essencial de uma designação que empresta um novo sentido ao visível». Pena é que a tradução não seja acompanhada de algumas notas explicativas, fundamentais para que um leigo pudesse compreender algumas das opções tomadas. Só para dar um exemplo, não consigo entender por que razão o título da primeira parte - Sept Pas Dans L’Éphémère - foi traduzido para Sete Passos No Inesperado, quando, logo no primeiro poema, se traduz o verso «Les pas de l’inespéré» por «O passo do inesperado» e, alguns poemas depois, o verso «Pour témoigner de l’éphémère» é transformado em «Para dar testemunho do efémero». Já agora, o verso «N’a d’autre nom que «l’inattendu»» foi traduzido assim: «Não possui outro nome senão «o inesperado»». Outros exemplos há que não fica bem a um leigo pôr em causa, embora, por incapacidade própria, me seja tremendamente difícil compreender tais opções. Ainda assim, aquilo que importa, a poesia de Yves Namur, saúda-se. É uma poesia do ínfimo, na medida em que procura, pela sua força sugestiva, tornar visível o invisível, aceder ao sentido do indefinido e do incompreensível. A brevidade dos poemas ajuda a essa concisão reflexiva que, mais do que ecoar o real, através de uma construção imagética e metafórica, torna presente a voz do nada, do silêncio, desse nada que é tudo, na medida em que: «O ínfimo é a única coisa / Que pode engrandecer-nos». A sombra de Rilke paira, realmente, sobre estes versos. Sobretudo na figura do anjo que aparece em vários poemas. Mas o que engrandece esta poesia é a sua minuciosidade, a precisão com que se movimenta no mínimo, a luz que oferece às figuras que, sendo do muito obscuro, não são do inexistente. Ainda que as interrogações prevaleçam.

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