No dia em que o Presidente da República vai falar à nação, lembro os portugueses de assuntos bem mais prementes: Luís Miguel [de Oliveira Perry] Nava nasceu em Viseu, precisamente a 29 de Setembro de 1957. Se fosse vivo, cumpriria hoje 52 anos de idade. Tal não se verificará, porque no dia 10 de Maio de 1995 alguém o assassinou no apartamento de Bruxelas onde o poeta residia. Pouco sei sobre esta história funesta. Dizem que foi degolado, mas nunca liguei muito ao assunto. Neste caso, a curiosidade tem sido desfeita por uma egoísta recorrência à obra. «Terei eu vivido desde que nasci?» ─ questionava-se Nava quando não podia sequer imaginar ser outra a questão que agora se impõe: estará o poeta vivo desde que morreu? Não só julgo que sim, como faço questão de o sublinhar. Uma das razões que o justifica é simples de entender. «Grande parte dos poemas de Luís Miguel Nava (embora sejam também o contrário disso, como veremos) constituem pequenas ficções que simulam a introspecção» (Silvina Rodrigues Lopes), são aquilo a que outrora se chamou poema em prosa e agora aparece, por vezes, confundido com a estória ou, nos casos mais limite, com a micronarrativa. Como bem notou Fernando J. B. Martinho, os textos em prosa de Nava, ou as suas «breves e perturbantes narrativas», «parecem deliberadamente jogar com a fluidez das fronteiras entre géneros». E este é, sem margem para dúvidas, um dos aspectos que mais admiro na obra poética de Luís Miguel Nava. Segundo me consta, essa obra começou a desenhar-se em 1974 com um livro, O Perdão da Puberdade, posteriormente rasurado da bibliografia activa. Um livro da juventude, pois claro. 1974 é o ano em que o autor de Vulcão (1994) conclui o ensino secundário, partindo no ano seguinte para Lisboa, onde se inscreve no curso de Filologia Românica. Casa-se em 1975, mas o casamento dura apenas três meses. Foi por essa altura que se deu um encontro determinante com Eugénio de Andrade. Nava destrói toda a sua obra inicial. Em 1978, ainda antes de terminar a licenciatura, recebe, pela obra Películas (Moraes, 1979), o Prémio Revelação da Associação Portuguesa de Escritores. Seguem-se um mestrado de Literatura Francesa, colaborações como crítico literário em jornais e revistas, A Inércia da Deserção ( &etc., 1981) e Como Alguém Disse (Contexto, 1982), assistência no Departamento de Literaturas Românicas da Faculdade de Letras. Em 1983, parte para Oxford. Aí permanecerá, durante três anos, como Leitor de Português. Em 1984, a &etc. publica-lhe mais um livro: Rebentação. Passa a residir em Bruxelas a partir de 1986, ocupando o lugar de tradutor no Conselho das Comunidades Europeias. Viaja pela Europa, Marrocos, Tunísia, México, etc.. «O Luís Miguel ficava atento aos pormenores do quotidiano das pessoas amigas. E do México ou doutro sítio qualquer inquietava-se com as dificuldades minhas, cá em Bruxelas. Mandava postais de todos os lados, com palavras bem sentidas. O Luís Miguel tinha um jeito especial para contar histórias engraçadas. Mas, no fundo, era pessimista, ou melhor, fatalista» ─ conta Marie Claire Vromans. Deixou livros de ensaio, uma Antologia de Poesia Portuguesa ─ 1960/1990, uma Fundação com o seu nome, que publica, desde 1997, a revista Relâmpago, vários livros de poemas e colaboração dispersa por jornais e revistas. Em Março de 2002, foi editada, pela Dom Quixote, a sua Poesia Completa. Todas as evocações aqui citadas, assim como a imagem do poeta ao alto, foram copiadas do n.º 1 da revista de poesia Relâmpago, publicada em Outubro de 1997.
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