A 9 de Setembro, nasceu Pavese. Decorria o ano da graça de 1908. Nasceu entre vinhas, numa quinta de Santo Stefano Belbo, terra natal de seu pai e destino de férias da família. O pai era funcionário judicial em Turim, mas Cesare conviverá pouco com ele. Morreu com um tumor cerebral quando o poeta ainda era uma criança de seis primaveras mal contadas. Consolina, a mãe, também não terá sido uma presença muito forte na vida do filho, vendo-o crescer de mão dada com uma profunda solidão. Pavese viveu praticamente toda a sua vida em Turim, a cidade onde Nietzsche procurou asilo para a loucura: «Turim é verdadeiramente a minha residência; ah, com que distinção sou aqui tratado!» Nesta cidade se formou o poeta de Lavor estanca (Trabalhar Cansa, Cotovia) com uma tese sobre a poesia de Walt Whitman. Porém, começa a escrever os primeiros poemas ainda nos tempos de liceu, motivado por Augusto Monti, um professor que se opôs publicamente ao regime de Mussolini. Fortemente influenciado pela literatura norte-americana, veio a traduzir imensas obras de autores de expressão inglesa, tais como Melville, Joyce, Dickens, entre muitos outros. Contactos precoces com os movimentos antifascistas proporcionar-lhe-ão o encontro de uma vida: Tina Pizzardo. Tina era professora de Matemática e militante clandestina do Partido Comunista. Estamos em 1929. Tina convence Pavese a receber em sua casa cartas do amante Altiero Spinelli, um antifascista que se encontrava preso. Pavese, para agradar a Tina, aceita receber as cartas que depois faz chegar às mãos da amada. Em Maio de 1935, a polícia encontra cartas de Spinelli na casa de Pavese. O poeta é condenado a três anos de prisão. Quando regressa de Brancaleone Calabro, Tina está casada. «O choque é tremendo. Nunca conseguirá compreender Tina, do mesmo modo que não compreenderá nenhuma das mulheres que amou e que se fundem na recordação desta: a primeira, a única» (Margarida Periquito). Entretanto, a primeira edição de Trabalhar Cansa, livro de poemas com que o autor se estreou, fora publicado em 1936. O diário publicado postumamente com o título O Ofício de Viver começara a ser escrito na prisão em Outubro de 1935. Depois de sair do cárcere, esteve três anos sem publicar o que quer que fosse da sua autoria. Mas, de certo modo, Pavese nunca foi desencarcerado. Os originais iam-se acumulando longe das montras e da censura. Pavese era uma espécie de conselheiro editorial da Einaudi, uma editora fundada pelo amigo de juventude Giulio Einaudi. O silêncio será quebrado com dois romances publicados em 1941. Refugiado no campo durante a guerra, acaba por inscrever-se no Partido Comunista quando os cestos sangrentos do fascismo já estavam a ser lavados. Em 1947 publica Dialoghi con Leucò , diálogos filosóficos mantidos entre figuras da Grécia antiga. Dois anos depois conhece a actriz norte-americana Constance Dowling, mas os ecos da experiência Pizzardo ainda se faziam escutar com cruel agitação. Ao longo dos tempos, Pavese foi formando uma afamada personalidade misógina. Para ele, todas as mulheres eram idênticas, «seres incapazes de corresponder aos seus anseios e expectativas, seres interesseiros, calculistas, traiçoeiros, que servem apenas para alimentar um masoquismo que ele parece cultivar» (idem). Deixará de cultivar o masoquismo a 18 de Agosto de 1950, depois de ingerir uma quantidade fatal de barbitúricos. Pouco tempo antes, tinha-lhe sido atribuído o Prémia Strega de Ficção pela colectânea La bella estate. Na última entrada do seu diário, escreveu:
A coisa mais secretamente temida acaba sempre por acontecer.
Escrevo: ó Tu, tem piedade. E depois?
Basta um pouco de coragem.
Quanto mais a dor é determinada e exacta, tanto mais o instinto de vida se revolta e a ideia de suicido tomba.
Quando em tal pensava, parecia fácil fazê-lo. No entanto, há pobres mulheres que o fizeram. O que se requer é humildade, não orgulho.
Tudo isto é asqueroso.
Palavras, não. Um gesto. Não escreverei mais.
A coisa mais secretamente temida acaba sempre por acontecer.
Escrevo: ó Tu, tem piedade. E depois?
Basta um pouco de coragem.
Quanto mais a dor é determinada e exacta, tanto mais o instinto de vida se revolta e a ideia de suicido tomba.
Quando em tal pensava, parecia fácil fazê-lo. No entanto, há pobres mulheres que o fizeram. O que se requer é humildade, não orgulho.
Tudo isto é asqueroso.
Palavras, não. Um gesto. Não escreverei mais.
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