Que me levou ao quarto pobre para me regalar:
A terra baldia que a Mr. Eliot parecia morte
Estimulou-me com paixão, vida e alento
Para prolongar por mais uma geração
Uma terra baldia satélite de veneração
Uma rolha, um bocado de osso, uma pedra
Não marcada em cartazes ou grandes estandartes
Para catapultar contra os conspiradores rodentes.
Ter-me-ia feito entender claramente?
Ata as tuas fitas a um novo mastro
De grupos guinchantes e rock-'n'-roll
Unindo tambores nativos a blues de terra baldia
Como bife de lombo a carne à jardineira,
Tudo serve para te sacudir a garganta e os pés
A feroz, feia, estranha derrota da morte
Que traz à vida e funde o grude
Que nos faz morrer como mezinha de bruxa.
...a britadora e turbo-broca que
Atravessa granito... como faca manteiga
(Devo seguir o nariz de M. Eliot
E rebitar este verso usando «Meiga»?)
Rock-a-bye-baby, chega à copa da árvore
Canta ao fazeres a colheita da maçã
Rouba todas as vozes truncadas de Ouarta-feira de Cinzas
Telefona ao Mardi-Gras para agarrar e partir:
Ata as fitas a um novo mastro.
A terra baldia foi o lugar onde melhor brinquei
Em miúdo ranhoso, de calção roto à pedrada:
De um quadro ferrugento e duas rodas de cama fiz
Uma bicicleta onde rodava e corria
Entre valados, por altos e baixos
E ferros-velhos anunciando «Armas para Espanha».
Uma pergunta de rata relampeja no ecrã:
«Como aprendeste a preencher requerimentos
E a atacar-nos com tempestades verbais?»
Li quase todo o pescador de girinos
O que Katy fez no seu primeiro Natal
O Conde de Monte Cristo, Notre Dame
A Ilha do Tesouro e a vergonha de Eliza
O esplêndido saque das casas de Usher
Por filantropos de rasgadas calças.
No inverno peles de coelho serviam bem
Para manter quentes as brasas desse conhecimento:
A terra baldia foi a minha biblioteca e faculdade.
Trad. Manuel de Seabra.
Romancista, dramaturgo, autor de livros infantis, Alan Sillitoe teve uma infância ensombrada pelas dificuldades económicas da família. Filho de Christopher Sillitoe e de Silvina Burton, gente humilde e iletrada da classe operária, Alan nasceu em Nottingham no dia 4 de Março de 1928. Obrigado a abandonar os estudos com apenas 14 anos, trabalhou como operário numa fábrica de bicicletas. Começou a escrever mais regularmente durante um internamento num hospital da RAF, após serviço militar cumprido na Malásia de onde trouxe uma tuberculose. Uma pequena pensão permitiu-lhe viver em França e na Espanha durante sete anos, onde foi recuperando da doença e intensificando o seu gosto pela literatura. Em 1951, conheceu a poeta norte-americana Ruth Fainlight que, apesar de se encontrar casada, resolveu acompanhar Sillitoe por França, Espanha e Itália, sobrevivendo ambos da pensão que o ex-militar auferia por serviços prestados à Royal Air Force. Em 1957 publicou o primeiro livro de poemas: Without Bear or Bread (fontes diversas apresentam The Rats and Other Poems, de 1960, como tendo sido o seu primeiro livro de poesia). Na ilha de Maiorca, travou conhecimento com Robert Graves, que o encorajou a escrever o romance Saturday Night and Sunday Morning (1958). O retrato da working-class de Nottingham foi um sucesso imediato, sendo posteriormente adaptado ao cinema. A escrita depurada e directa, mesmo vernacular, de Alan Sillitoe transformou-o num representante de uma espécie de neo-realismo britânico. Um ano depois da edição do primeiro romance, Alan Sillitoe casou com Ruth Fainlight. Embora a crítica nunca tenha sido generosa para o Sillitoe poeta, este fez sempre questão de afirmar esta sua condição como anterior à de ficcionista. Em 1963, passou algum tempo na União Soviética. O facto não é displicente, até porque terá contribuído para reforçar a catalogação do autor, embora contra desejo do próprio, como um dos «angry young men» que constituíam um grupo informal de escritores britânicos, provenientes das classes operária e média, entre os quais figurava John Osborne, autor de Look Back in Anger. Entre outros, foram-lhe atribuídos um Hawthornden Prize (1959) e várias condecorações académicas pela vastíssima obra publicada.
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