quarta-feira, 3 de março de 2010

PESCAR SOMBRAS

Tenho andado pela costa a pescar sombras. Se não entendeis, pensai nos lugares de descanso. Para lá chegar é preciso, primeiro, cansar os músculos. As virilhas ressentem-se, a idade começa a pesar, mas o coração aguenta sempre mais do que julgamos ser possível. Quem quiser, que perca o seu tempo com mesquinharias. Mas onde vai o corpo buscar a energia que falta ao espírito?


Às nuvens, talvez. Carregadas de um mar com asas. Ou ao sol, essa flecha que atravessa muros de treva para nos vir banhar os olhos ao mesmo tempo que mergulha na garganta de todos os medos. Ameaçado pela rouquidão da garganta revolteada, persigo as pegadas junto à rebentação. A espuma confunde-se com os dias. Quem quiser, que perca o seu tempo com mesquinharias. Ao longe, a realidade inclinada.

Ainda há quem desafie a natureza. Talvez com um respeito que nos tem faltado. Por isso nos espantamos, neste início de ano pavoroso, com a terra que treme, as fendas abertas no alcatrão, os corpos engolidos pela ferocidade das águas, todo um modo de vida arrastado pela lama para um outro lugar qualquer. Um lugar de silêncio, quem sabe? Quem quiser, que perca o seu tempo com mesquinharias.


De tudo o que tem acontecido, registe-se a beleza medonha que esta força imprime nas nossas parcas vidas. A qualquer instante comestíveis, somos alimento de velhos mitos, fantasmagorias acordadas, recuperadas, relembradas pela destruição e pelo pavor. No fundo, nada somos. Queremos pensar o contrário, mas a natureza vai-se encarregando de nos desmentir.

Praia do Salgado, Nazaré.

4 comentários:

rff disse...

Sem exagero, uma das mais belas praias onde já estive. E que saudades tenho de lá ir....

Abraço

hmbf disse...

Estive lá hoje. E, por acaso, lembrei-me de ti. Abraço,

P.S.: E se fôssemos a Madrid? :-)

maria disse...

belas fotos...e palavras.

hmbf disse...

Obrigado MC. Cada vez mais me convenço de que nem sabemos a sorte que temos en viver junto a esta costa.