terça-feira, 20 de abril de 2010

EVOLUÇÃO


Fui rocha, em tempo, e fui, no mundo antigo,
Tronco ou ramo na incógnita floresta…
Onda, espumei, quebrando-me na aresta
Do granito, antiquíssimo inimigo…

Rugi, fera talvez, buscando abrigo
Na caverna que ensombra urze e giesta;
Ou, monstro primitivo, ergui a testa
No limoso paul glauco pacigo…

Hoje, sou homem ─ e na sombra enorme
Vejo, a meus pés, a escada multiforme,
Que desce, em espirais, na imensidade…

Interrogo o infinito e às vezes choro…
Mas, estendendo as mãos no vácuo, adoro
E aspiro unicamente à liberdade.



Antero de Quental nasceu em Ponta Delgada a 18 de Abril de 1842, no seio de uma das mais antigas famílias locais. Partiu para Lisboa com apenas 10 anos de idade, tendo ingressado posteriormente na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Nesse tempo, começou por se destacar como autor de panfletos contra o conservadorismo que vigorava (e de algum modo ainda vigora) em Portugal. Nos jornais e nas revistas de Coimbra, publicou os primeiros poemas e artigos de crítica literária ou índole política e filosófica. «Em 1865, aos vinte e três anos, e «arrumado», definitivamente, o canudo de bacharel em Direito, Antero lançar-se-á à procura de si mesmo e da sua inserção no «Mundo» que, temporalmente, lhe coubera em sorte. Ora, esse «Mundo» ─ lembre-se ─ é o da Revolução Industrial e das suas sequelas estruturais: a alteração dos tradicionais ritmos de vida e de movimentação; a «questão social» e os novos apelos de liberdade e de justiça: o socialismo versus o liberalismo…» (Joel Serrão) Para trás tinham ficado, entre outros, os Sonetos de Anthero (1861). 1865 foi o ano das Odes Modernas, advento de uma certa modernidade que originou forte polémica inscrita na História da Literatura Portuguesa como a Questão Coimbrã. Há quem se refira inclusive a um duelo à espada entre Quental e Ramalho Ortigão, tendo este ficado ferido num pulso. Tomado pelos ideais socialistas, Antero de Quental foi tipógrafo na Imprensa Nacional e em Paris. De regresso a Lisboa, aceitou colaborar num jornal democrático e iberista. Seguiram-se viagens aos EUA e Canadá, intensa actividade política e propagandística, as denominadas Conferências do Casino, inauguradas em 1871 com um programa onde pontificavam, entre outros, Eça de Queiroz, J. P. Oliveira Martins, Manuel de Arriaga e Teófilo Braga. É dessa época o célebre Causas da decadência dos povos peninsulares nos três últimos séculos. Proibidas as conferências, Antero dedicou-se novamente à literatura, nunca abandonando, porém, as preocupações políticas e um forte sentido de intervenção social. 1874 marcou o aparecimento dos primeiros sintomas de doença nunca diagnosticada (constituição maníaco-depressiva?). Antero de Quental consultou vários médicos nacionais e internacionais. A conselho de um famoso médico parisiense chamado Charcot, isolou-se num estabelecimento termal nos arredores de Paris. Outrora atormentado filosófica e politicamente, sucumbia agora aos tormentos psicológicos. Recorde-se, porém, que já em 1868 o tom que perpassava na epistolografia do poeta não era o mais animador: «Aqui estou em Lisboa: nada mais te posso dizer, porque não conheço razões de aqui estar senão todas negativas, isto é, por não poder estar noutra parte». Ainda assim, a desilusão não o impediu de candidatar-se a deputado pelo Partido Socialista nas eleições gerais de 1879 e 1880. No ano seguinte, adoptou as filhas do seu falecido amigo Germano Meireles. Fixou residência em Vila do Conde, onde viveu durante dez anos. «No imaginário anteriano, poesia e filosofia foram sempre ─ e de 1865 a 1885 ─ formas gémeas ou de matricial convergência da mesma inquietude fundamental. (…) Com efeito, pode verificar-se que a produção poética anteriana seria contínua desde os dezasseis aos quarenta e três anos, ou seja, de 1858 até 1885, data do último soneto» (idem). Desiludido com a situação nacional, regressou a Ponta Delgada com as filhas adoptivas. No dia 11 de Setembro de 1891, suicidou-se, no Largo de São Francisco, junto ao Convento da Esperança.

1 comentário:

Anabela disse...

Henrique Henrique:

-Tem livros de interior?

-Decoração?!

-Não, não. Aqueles livros para dentro, para aumentar a alma.

Passado dez minutos:

-Tem o livro A Floresta da Sofia de Breyner Andresen?

:)