Camarada Van Zeller, enquanto as luminárias da nação discutiam a crise entre mais um uísque e crónica paga a preço de mestre, eu estive a lutar contra a depressão universal, tanto quanto me afundei mais um pouco na depressão particular. Que quer vossa excelência? Vivo nesta bipolaridade. Se, por um lado, sinto nos meus esforços um dever pátrio, é certo que, por outro lado, não deixo de sentir nesses mesmos esforços uma enorme frustração pessoal. Está visto que festejei o 1º de Maio à trabalhador, aviando toneladas de livros, substituindo campanhas, afinando a paciência. Entre as toneladas de livros aviados, a surpresa: vendi-me a mim próprio. Estranha sensação, esta de estar a vender-me a mim próprio. Não bastou ter escrito o objecto, sacrificam-me agora com o castigo de o vender. Depois meto-me a fazer contas. Naquele livro estão os esforços de um autor, de um editor, por vezes de um tradutor e de um revisor, de um designer/paginador, de uma gráfica, de um distribuidor, de um revendedor. Como se não bastasse, sem ter feito esforço algum, o Estado também reclama a sua fatia do pudim. Não admira, pois, que nesta viagem que o livro faz entre as mãos do autor e as mãos do leitor, haja quem tenha de morrer à fome. Normalmente é o autor, o que não deixa de ser bem feito. Quem é que o manda pôr-se a escrever livros em vez de fazer qualquer coisa de útil para a sociedade?
Podia antes escrever crónicas como as do Vasco Pulido Valente. Este xamã da nação é um entre muitos que tem a solução para a crise, essa malfadada crise que me levou à exaustão durante o fim-de-semana. Antes de irmos às medidas, não posso deixar de pensar na injustiça que é não entregarem os desígnios do país a gente como o Valente. Ou o Medina. Ou o meu caro camarada Van Zeller. Os senhores é que nos deviam governar, tanta é a sabedoria que exibem e a alquimia que dominam.
O Vasco quer reduzir o número de feriados, o que para mim é uma chatice pois são os únicos dias em que o meu trabalho é pago como deve ser. Como ele não trabalha nos feriados, tanto se lhe dá. Ele quer fechar empresas públicas, mas eu vou mais longe: fechava o próprio Estado, com o Vasco lá dentro. Quer fechar fundações sustentadas pelo Governo, o que seria uma chatice para os meus amigos artistas e para muitos amigos do Vasco que se fartam de produzir “estudos” à conta de tais fundações. Ele quer vender as propriedades do Estado que não tenham interesse nacional. Resta saber quem é que as quererá comprar. A mesma desconfiança vale para a venda dos submarinos e do armamento inútil. Aliás, este ponto é demonstrativo da inteligência que preside às luminárias da nação. Mas quem é que quererá comprar aos portugueses o armamento inútil que os portugueses compraram? Quem serão os néscios com quem poderemos negociar a nossa fatídica estupidez? Antes de procurar vender, não teria sido mais inteligente nunca ter comprado?
O Vasco também quer demolir e vender autódromos. Vendê-los demolidos? Hmmmm…. Tipo, quem quer comprar estas ruínas de um magnifico autódromo que outrora aqui existiu? Eu proponho que o vendam ao meu vizinho cigano que passa o tempo todo a fazer piões aqui no bairro com a sua moto 4. O Vasco quer suspender os grandes projectos. Acho bem. Comecemos por suspender estes grandes projectos do Vasco. Ele não quer nem mais um quilómetro de auto-estrada, nem mais um funcionário público, e eu também não, não só por uma questão de prevenção contra a sinistralidade rodoviária, mas, sobretudo, por uma questão ambiental (refiro-me aos funcionários públicos, malta que geralmente cheira a suor que se farta). O Vasco quer eliminar serviços nocivos como o Instituto do Livro. Eu proponho que se elimine o próprio livro (o de recibos verdes, claro). Ele quer congelar promoções no funcionalismo durante 5 anos, parecendo-me mais útil que congelemos o Vasco tendo em vista uma perspectiva de futuro: podermos contar com ele no ano 2500. Ele quer acabar com o subsídio de férias… Ups. Estou sem palavras.
Acabar com o subsídio de férias? Então e depois como é que eu posso amortizar os créditos? Julgará o Vasco que o subsídio de férias de um tipo que ganha o salário mínimo é para passar férias no Egipto, ir a Nova Iorque ou visitar a Tate Gallery? Por que não começarmos pelas reformas insultuosas de milhares de indivíduos que nunca fizeram senão mamar desse Estado que tanto detestam? Por que não acabar com as forças armadas? E com consulados e cônsules e embaixadores e embaixatrizes que não servem senão para promover viagens e oferecer jantaradas aos amigos intelectuais da lusa pátria? E as regalias dos deputados e dos ministros e dos secretários e sub-secretários e toda essa cambada que passa a vida a roçar o cu nas cadeiras do poder? E esses especuladores de merda que engordam à conta de offshores nos quais ninguém mete a mão e que andam de panelinhas feitas com gestores e administradores públicos? Não é muito, mas seria um começo.
2 comentários:
Van Zeller ao poder! VAN ZELLER AO PODER!
Voto nisso. :-)
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