Quando não se fala inglês,
ouvir falar de um bom romance policial inglês
que não foi traduzido para alemão.
Ver, quando faz calor, uma cerveja
que não se pode pagar.
Ter um novo pensamento
que não se pode embrulhar num verso de Hölderlin
como fazem os professores.
Em viagem, à noite, ouvir bater as ondas
e dizer para si que elas sempre o fazem.
Muito grave: ser convidado,
quando lá em casa há mais sossego,
o café é melhor
e não é preciso conversar.
O mais grave de tudo:
não morrer no Verão,
quando tudo é claro
e a terra é leve para a enxada.
Versão de Vasco Graça Moura.
Nascido a 2 de Maio de 1886, em Mansfeld, no Bandenburgo, Gottfried Benn foi o mais velho dos filhos de uma larga família dada à luz por um pastor protestante (Gustav Benn) e uma suíça de língua francesa (Caroline Benn). Cresceu a contar histórias aos irmãos mais novos e a odiar a austeridade paterna, que o obrigou a estudos de teologia, primeiro, filologia, depois, e de medicina, finalmente, apesar do seu interesse pelas letras. A perda da mãe, aos 26 anos, forneceu-lhe o motivo para o primeiro livro de poemas: Morgue und andere Gedichte (1912). À publicação do livro, seguiram-se contactos com Else Lasker-Schüler e editores e escritores expressionistas. Enquanto prestava serviços médicos durante a Primeira Grande Guerra, apaixonou-se pela actriz Edith Brosin. O casamento pouco durou. Benn perdeu a mulher em 1921. Especializado em doenças sexuais, atraído pelo nazismo e pela cantora de ópera Ellen Overgaard (a ordem de interesses é aleatória), acabou por ser ostracizado pelos parceiros mais liberais. Mas o regime do Führer também não lhe foi menos hostil. «O poeta passou a uma forma aristocrática de emigração; remetido ao silêncio desde 1936, data em que ainda saem os seus Poemas Escolhidos, silêncio em que vai ficar até 1948 (Poemas Estáticos), em Maio de 1938 fora excluído da Câmara dos Escritores, com radical proibição de escrever e publicar» (Vasco Graça Moura). A razão da hostilidade nazi ter-se-á ficado a dever, antes de mais, ao simples facto dos seus livros terem sido publicados por firmas presididas por judeus. Mas também foi acusado de publicar uma poesia degenerada e homossexual. Ainda assim, voltou a servir durante a Segunda Grande Guerra. Para trás tinham ficado, além dos poemários, uma novela e algumas peças teatrais. Voltou a casar uma segunda e uma terceira vezes. A sua segunda mulher, que era igualmente sua secretária, suicidou-se em Julho de 1945 e, em Dezembro de 1946, o poeta juntou-se a uma jovem dentista chamada Ilse Kaul. Terminada a Guerra, foi relegado ao silêncio pelos aliados. Só a publicação dos Poemas Estáticos reabilitou o autor, publicando a partir de então trabalhos em prosa e em verso. Em 1951, foi-lhe atribuído o Prémio Georg Büchner. Morreu no dia 7 de Julho de 1956, vítima de cancro nos ossos.
Sem comentários:
Enviar um comentário