domingo, 12 de junho de 2011
NOITE
Talvez esta noite não seja noite,
deve ser um sol horrendo, ou
o outro, ou qualquer coisa…
Que sei eu? Faltam palavras,
falta candura, falta poesia
quando o sangue chora e chora!
Podia ser tão feliz esta noite!
Se apenas me fosse possível tactear
as sombras, ouvir passos,
dizer «boas noites» a quem quer
que passeasse o seu cão,
olharia a lua, diria a sua
estranha lactescência, tropeçaria
nas pedras ao acaso, como se faz.
Mas há algo que rasga a pele,
uma fúria cega
que percorre as minhas veias.
Quero sair! Cérbero da alma:
Deixa, deixa-me atravessar o teu sorriso!
Podia ser tão feliz esta noite!
Porém ficam os sonhos adiados.
E tantos livros! E tantas luzes!
E meus poucos anos! Porque não?
A morte está longe. Não me vê.
Tanta vida Senhor!
Para quê tanta vida?
Alejandra Pizarnik, in La Ultima Inocência (1956)
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