Há coisa de três anos fui convidado a integrar o júri da primeira (e que eu saiba, até à data, única) edição do Prémio Nacional Poeta Ruy Belo. José Niza era igualmente um dos elementos do júri. Estive com ele, salvo erro, duas vezes. Numa reunião para decidirmos a atribuição do prémio e na cerimónia de entrega do dito. Depois da cerimónia, fomos almoçar. Calhou que ficássemos sentados ao lado um do outro durante o almoço. Ouvi-lhe várias histórias com a atenção de um aprendiz. Era um homem afável. Era inevitável que falássemos de E Depois do Adeus, versos que Niza escreveu e Paulo de Carvalho imortalizou no Festival de 1974. A revolução contribuiu para a popularidade. Niza, autor da letra, chamou-lhe «canção vulgar». Discordou do meu entusiasmo e pareceu-me algo aborrecido com a colagem ao tema. Tomara muitos fazerem algo que os vindouros possam identificar como seu. Em Abril de 2008 O Mirante publicou um livro de poemas de José Niza. Fica um, em jeito de homenagem, porque nem tudo são canções:
VELÓRIO
Estavam todos tristes
muito tristes
com gravatas pretas de tristeza
contando anedotas
o defunto levantou a cabeça do caixão
e perguntou
amigos
a que horas é o funeral?
às nove da manhã!
disseram cheios de medo
então boa noite
que amanhã
vou levantar-me cedo
12 de Março de 1971
José Niza, in Poemas de Guerra – Angola 1969-1971, O Mirante, Abril de 2008, p. 57.
2 comentários:
Tomaram muitos fazer algo que os vindouros pudessem identificar como seu... (acho que assim é que é).
A.M.
Que máximo! O poema, claro... E o distanciamento do Niza da canção...
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