domingo, 30 de outubro de 2011

THE TREE OF LIFE




As obras de Terrence Malick atiram-me para o vazio. É assim desde Badlands (1973), um filme que tenho gravado numa cassete VHS e que me ajudou a perceber, pela primeira vez, a cobardia subjacente a todas as minhas acções. The Tree of Life (2001) transporta-me para um território místico onde não me sinto nada confortável. A justaposição das relações pai-filho e deus-homem inspira-me mais dúvidas do que convicções. Malick é inteligente, parece querer resolver, ou pelo menos evitar, a separação entre Deus e a Natureza, colocando ambos num só corpo reflectido na mais contemplativa das aventuras visuais que me foram dadas a ver nos últimos anos. Se pelo meio aparece o universo nas suas contínuas metamorfoses, com explosões de magma, dinossauros em queda e estrelas em expansão, apontando-nos o sentido de uma vida mutável e errática, isso quer dizer que Deus não encaixa nas vetustas caracterizações de perfeição e imutabilidade. Essa força que nos transcende e tudo cria, como também tudo destrói, gera no interior dos indivíduos um conflito porventura insanável. O fim do mundo é apenas o princípio do mundo. A questão já não está , pois, em reduzir a existência a uma mera passagem pela Terra determinada pela experiência da morte, mas antes em tentar compreender o mistério da existência a partir da única certeza que a lógica do pensamento nos permite: a vida continua, como sempre continuou, para lá de todas as catástrofes. Vale a pena o sofrimento? É certo que nascemos, vivemos e morremos, mas assim como nós nascemos, vivemos e morremos outros, antes de nós, nasceram, viveram e morreram e outros, depois de nós, nascerão, viverão e morrerão. O vazio está em que a percepção desta realidade interpela-nos sem direito a resposta. Tudo o que possamos pensar, julgar, não passará de uma desinteressante vacuidade perante a força das evidências: somos ínfimos, mais vale cumprirmos essa infimidade na luz pacificadora da única grande lei que está ao nosso alcance, ou seja, a lei do amor. Há ainda a esperança e a fé, mais forte nuns corações do que noutros, sempre sujeitas à gravidade dos conflitos que barram as emoções. Através dos tempos, por entre paisagens ora inóspitas, ora consoladoras, é nestas areias que os homens vão construindo os seus castelos. O pai e o filho que aparecem à sombra desta Árvore são o resumo de um conflito inerente à própria condição humana, esse conflito que a determinada altura da vida nos obriga a optar entre os castelos de areia com que explicamos a vida e definimos a existência ou a enigmática e inexplicável força das emoções que guiam a vontade e o desejo. Não deve ser por acaso que Malick escolheu para pai um músico frustrado convertido em ambicioso homem de negócios. Talvez Deus não seja diferente, viu a sua carreira de músico interrompida pelas necessidades práticas da criação. Eis a explicação para o desconcerto do mundo, somos governados por um pai severo, sem piedade nem misericórdia, que olha para os filhos temendo que eles se transformem naquilo que ele não pôde ser.

1 comentário:

sara rocio disse...

:)
Não imaginas a dificuldade que tive para perceber o porquê deste filme me ter inquietado tanto. Eu tentei explicar... a mim e aos outros que quiseram saber, mas não consegui, acho.
A tua escrita torna mais claras as sensações essenciais.