Clint Eastwood não é um especial adepto dos happy endings, preferindo antes levar as suas personagens a extremos de exaustão narrativa. Esta exaustão revela-se no momento em que o indivíduo, imerso nas (im)possibilidades da sua situação existencial, se depara sem soluções. É provável que a determinada altura nas encruzilhadas da vida os caminhos se tornem de sentido único, sem saída, e as pessoas se sintam obrigadas a agir já não em função dos seus critérios morais mas sim determinadas pela força das circunstâncias. O mais relevante neste tipo de personagens pode ser entendido a partir de duas perspectivas. A primeira é a daquele que julga ser a consciência a dimensão do homem que mais condiciona a moralidade, a segunda substitui a consciência pela necessidade. O mais curioso é que, entre ambas, a liberdade encontra melhor o seu lugar nos ditames da necessidade e na quase recusa da consciência, ou seja, é quando o homem determinado pelos valores morais resolve deixar de resistir à necessidade que a liberdade se afirma. O dilema é ontológico e coloca em questão as teses que opõem a liberdade ao necessário como se o necessário, por ser o mais natural, fosse o princípio a partir do qual a liberdade pode afirmar-se. Isto significa que, em consciência, a liberdade tem tanto a sua fundamentação na resistência à moral como na resistência aos instintos. Parece um desígnio perigoso, este de colocar o acto livre na teia da necessidade. Veja-se Million Dollar Baby. O conflito vivido pelo treinador Frankie Dunn é o de obedecer cega e indolentemente à sua moral ou o de lhe desobedecer cedendo à força das emoções, impedindo, dessa forma, a perpetuação do sofrimento da atleta Maggie Fitzgerald. O lema de Frankie no ringue – protege-te sempre – é igualmente o seu lema na vida, pelo que se lhe torna ainda mais imponderável desligar a máquina a que Maggie ficou vitalmente ligada após um combate decisivo. Desligar pode muito bem ser, em certas circunstâncias, a melhor forma de nos protegermos. Já não apenas dos outros, mas sobretudo de nós próprios. E nessa opção eu consigo notar tanta liberdade como noutra qualquer.
domingo, 27 de novembro de 2011
MILLION DOLLAR BABY
Clint Eastwood não é um especial adepto dos happy endings, preferindo antes levar as suas personagens a extremos de exaustão narrativa. Esta exaustão revela-se no momento em que o indivíduo, imerso nas (im)possibilidades da sua situação existencial, se depara sem soluções. É provável que a determinada altura nas encruzilhadas da vida os caminhos se tornem de sentido único, sem saída, e as pessoas se sintam obrigadas a agir já não em função dos seus critérios morais mas sim determinadas pela força das circunstâncias. O mais relevante neste tipo de personagens pode ser entendido a partir de duas perspectivas. A primeira é a daquele que julga ser a consciência a dimensão do homem que mais condiciona a moralidade, a segunda substitui a consciência pela necessidade. O mais curioso é que, entre ambas, a liberdade encontra melhor o seu lugar nos ditames da necessidade e na quase recusa da consciência, ou seja, é quando o homem determinado pelos valores morais resolve deixar de resistir à necessidade que a liberdade se afirma. O dilema é ontológico e coloca em questão as teses que opõem a liberdade ao necessário como se o necessário, por ser o mais natural, fosse o princípio a partir do qual a liberdade pode afirmar-se. Isto significa que, em consciência, a liberdade tem tanto a sua fundamentação na resistência à moral como na resistência aos instintos. Parece um desígnio perigoso, este de colocar o acto livre na teia da necessidade. Veja-se Million Dollar Baby. O conflito vivido pelo treinador Frankie Dunn é o de obedecer cega e indolentemente à sua moral ou o de lhe desobedecer cedendo à força das emoções, impedindo, dessa forma, a perpetuação do sofrimento da atleta Maggie Fitzgerald. O lema de Frankie no ringue – protege-te sempre – é igualmente o seu lema na vida, pelo que se lhe torna ainda mais imponderável desligar a máquina a que Maggie ficou vitalmente ligada após um combate decisivo. Desligar pode muito bem ser, em certas circunstâncias, a melhor forma de nos protegermos. Já não apenas dos outros, mas sobretudo de nós próprios. E nessa opção eu consigo notar tanta liberdade como noutra qualquer.
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