domingo, 20 de maio de 2012

SHORT SHORTS

Short Shorts: An Anthology of the Shortest Stories, originalmente publicada em 1982 no Reino Unido, conheceu esta edição da Bantam Books um ano depois. Os seus organizadores foram Irving Howe e Ilana Wiener Howe. Do primeiro há basta biografia disponível na Internet. Socialista moderado nascido no Bronx, tinha descendência judaica e serviu no exército norte-americano durante a II Grande Guerra. Depois tornou-se crítico da Partisan e escreveu inúmeros ensaios. Foi professor de literatura Yiddish, pelo que não é de estranhar a presença nesta antologia de algumas figuras proeminentes desse universo. Dos menos conhecidos entre nós há a salientar Sholem Aleichem e I. L. Peretz. O primeiro nasceu em Hasidic, na Rússia, país que abandonaria após o pogrom de 1905. Considerado um dos maiores humoristas da literatura Yiddish, escreveu várias peças de teatro, romances e, claro está, contos. Aparece aqui representado com uma história intitulada A Yom Kippur Scandal, onde podemos perceber uma ironia especialmente direcionada para as questões judaicas: «Squeezing is a Jewish custom. If no one squeezes us, we squeeze each other» (p. 57). Contemporâneo de Sholem Aleichem, I. L. Peretz nasceu na Polónia e estreou-se numa antologia organizada por aquele. If Not Higher, o conto aqui recolhido, não destoa. Num estilo abertamente humorístico, coloca em acção um rabi e um “litvak” (judeu lituano, à época representante de uma das maiores e mais influentes comunidades judaicas em toda a Europa). Autores como estes, porventura menos conhecidos do público português, partilham o espaço da antologia com nomes consagrados ou bastamente conhecidos: Leo Tolstoy, Heinrich von Kleist, Anton Chekhov, Stephen Crane, Guy de Maupassant, James Joyce, D. H. Lawrence, Luigi Pirandello, Franz Kafka, Sherwood Anderson, Ernest Hemingway, Giuseppe di Lampedusa, Isaac Babel, William Carlos Williams, Yukio Mishima, Doris Lessing, Jorge Luis Borges, Octavio Paz, Gabriel García Márquez, Augusto Monterroso, Heinrich Böll (mantenho a grafia anglo-saxónica). A única voz da língua portuguesa seleccionada é o brasileiro João Guimarães Rosa. Há ainda autores algo esquecidos, mas já publicados em Portugal, tais como Katherine Anne Porter, autora do romance A Nave dos Loucos (Livros do Brasil), Varlam Shalamov ou Grace Paley, ambos com livros no excelente catálogo da Relógio d’Água: Contos de Kolimá, o primeiro, e Pequenas Contrariedades da Existência, a segunda. Entre as surpresas, pelo menos para mim, contei o suíço Gottfried Keller, poeta, romancista e contista de quem nunca ouvira falar; o russo Mikhail Zoschenko, cujo conto me aventurei a reproduzir aqui; a argentina Luisa Valenzuela, a mais nova dos autores coligidos; a alemã Maria Luise Kaschnitz, essencialmente poeta; os norte-americanos Jerome Weidman, Paula Fox e James Thurber. Fiquei especialmente impressionado com o último. Cartoonista de primeira linha, publicou as suas histórias de tom satírico, sobretudo, na The New Yorker. Nunca conseguiu afirmar-se enquanto escritor, mas o conto que o representa nesta antologia é muito bom. If Grant Had Been Drinking at Appomattox satiriza factos históricos com incrível sentido de humor, abrindo hipóteses caricatas para eventos dramáticos. No caso, a célebre rendição do General Robert E. Lee, rosto de um dos mais célebres selos dos states, perante um ressacado Ulysses S. Grant. Este olha para Lee e confunde-o com o poeta Robert Browning (a piada é óbvia, dada a semelhança física entre ambos), acabando por lhe colocar a espada nas mãos como se fosse Grant, e não Lee, quem estivesse a render-se. Por fim, remata: «We dam' near licked you. If I'd been feeling better we would of licked you» (p. 147). Vale a pena descobrir James Thurber, mais que não seja pelo seu olhar cómico tragicamente ironizado pela realidade: era cego de um olho.

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