sábado, 29 de dezembro de 2012

TRUE GRIT (1969)


Em 1969, John Wayne tinha 62 anos e contava com centenas de participações em filmes de sucesso e de interesse desigual. A sua reputação como actor estava estabelecida, confundindo-se em grande parte com a figura de herói do Oeste consolidada por inúmeros papéis em westerns de relevo. Realizadores como John Ford ou Howard Hawks foram alguns dos melhores com quem trabalhou. Não tão reconhecido como estes, Henry Hathaway (1898-1985) também deu cartas no género. True Grit, adaptação do romance de Charles Portis, foi o derradeiro dos seus westerns e um dos últimos filmes que realizou. A escolha não podia ter sido melhor, valendo a John Wayne um Oscar pelo desempenho como melhor actor principal.
Exibido por cá com o título A Velha Raposa, True Grit mistura numa só história vários elementos típicos do western: a caça ao homem, o contraste entre o território selvagem onde decorre a maior parte da acção e as cenas iniciais em Fort Smith, as relações de confiança/desconfiança entre as várias personagens, a problematização de uma justiça demasiado personalizada. Podemos mesmo dividir o filme em duas partes. Uma primeira concentrada na cidade, com as suas instituições e formalidades. A outra, no território selvagem para onde a jovem Mattie Ross, o Marshall Rooster Cogburn e o ranger do Texas La Boeuf se deslocam no encalço de um assassino em fuga.
Esta deslocação permite-nos acompanhar duas realidades distintas, a da cidade com as suas formalidades e a de um mundo onde a coragem se sobrepõe às formalidades na consecução da justiça. Contraste tanto mais importante quanto se revela claro o retrato de Fort Smith traçado nas cenas iniciais, com um triplo enforcamento público e o juiz a assistir à execução na varanda do tribunal. Na pensão onde Mattie e La Boeuf estão instalados, este tem de tirar as esporas, quando se senta à mesa, para não riscar as cadeiras. Mas a Mattie Ross (Kim Darby) não convêm tais formalidades. Para vingar a morte do pai e capturar o seu assassino, Mattie contrata o mais duro e rijo dos oficiais de justiça.
É o velho e sórdido Marshall Rooster Cogburn (John Wayne), alcoólico, zarolho e nada formal, quem ela contrata. A ambos junta-se La Boeuf (o cantor Glen Campbell), que também anda no encalço do mesmo fugitivo por razões diversas mas com o mesmo propósito. Tom Chaney, o assassino em fuga, abrigou-se no bando de Ned Pepper (Robert Duvall) em território índio. É por lá que se desenrolará grande parte da acção, quiçá a mais relevante. O contraste entre Fort Smith, com os seus tribunais, advogados, com as suas prisões e enforcamentos públicos, com as suas negociatas e o seu convencionalismo social emergente, e o comportamento destas personagens em território selvagem é deveras elucidativo de um distanciamento (ou de uma aproximação) dos valores essenciais que constroem os grandes seres humanos.
Daí que o elemento essencial neste filme acabe por se revelar apenas no final, quando vimos desabrochar na personalidade pedregosa de Rooster Cogburn um comovente paternalismo para com Mattie Ross. Dentro do velho Cogburn ainda florescem sentimentos e emoções. Torna-se fácil de entender o quão emblemático é este papel na carreira de um actor como John Wayne, desmascarado aos 62 anos pela interpretação de um velho Marshal de reputação duvidosa. O lado sentimental e afectuoso da personagem confere-lhe uma dimensão humana que já não é apenas a do herói implacável e algo sobre-humano, é a de um indivíduo com as suas fragilidades ocultadas pelo manto da coragem e da determinação.

1 comentário:

Claudia Sousa Dias disse...

Já vi ambas as versões. Adorei a interpretação da miúda na mais recente.