segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

HANG ‘EM HIGH (1968)





A sequência do enforcamento público que acompanha a chegada de Mattie Ross a Fort Smith, Arkansas, remeteu-me para um western do praticamente desconhecido Ted Post (1918). Hang ‘em High foi o seu terceiro filme para cinema e conta com Clint Eastwood no papel principal. Eastwood é um ex-agente da lei, convertido em cowboy, apanhado por engano no centro de um linchamento, depois do homem a quem tinha comprado uma manada de vacas ter sido assassinado com toda a sua família. Já pendurado pelo pescoço, Eastwood, isto é, Jed Cooper, é salvo da morte por um Marshal de passagem naquela zona. O Marshal chama-se Dave Bliss (Ben Johnson) e trabalha para o juiz Fenton (Pat Hingle) num suposto Fort Grant, na região do Oklahoma.
Na realidade, trata-se exactamente de Fort Smith e o juiz Fenton é, nada mais, nada menos, do que o impiedoso Isaac Charles Parker, que ficou conhecido para a história dos EUA como o juiz dos enforcamentos. Esta realidade histórica, que em True Grit aparece referida lateralmente, é o pano de fundo do filme de Ted Post. Mas Hang ‘em High tem um outro elo, simplesmente caricato, com o True Grit de Henry Hathaway. Em ambos Dennis Hopper surge para ser assassinado na única cena em que aparece. Um outro actor que reencontramos em Hang ‘em High é Ben Johnson, o Chris Calloway de Shane. Pormenores do elenco que, sem serem fundamentais, estabelecem algumas ligações curiosas na história do western.
O que é essencial, neste caso, é a recriação do ambiente justicialista que encontramos em múltiplos destes filmes. Lembram-se do linchamento popular de Johnny Guitar? Realista ou caricatural, este ambiente ajudou a estereotipar uma imagem do antigo Oeste que está longe de ser pacífica. Inegável parece ser a evolução de uma humanidade que, afinal, já passou e, de certo modo, continua a passar por coliseus romanos, torturas públicas, lapidações, vias-sacras, fogueiras medievais, caças às bruxas e ao homem, fábricas de morte como campos de concentração e “gulags”. A história da justiça, ao contrário desta, não é cega; esquece-se, por vezes, de que entre o crime, a condenação e a pena há a vontade popular.
Ora, este filme de Ted Post questiona, precisamente, uma justiça desenhada à imagem e semelhança da vontade popular. Opondo-se a esta vontade (a missão do Marshal Jed Cooper será levar à justiça os homens que o lincharam), contrariando esse conceito de “justiça pelas próprias mãos”, acaba por a ela sucumbir sempre que se transforma em espectáculo. A caracterização de Fort Smith, convertido em Fort Grant, é inclemente, tendo Post carregado nas cores que nem Hathaway, nem mesmo os irmãos Coen, quiseram repetir. O aspecto moralmente sórdido da execução pública é transformado num espectáculo deplorável, com o povo a consumir cerveja gelada e doces enquanto aguarda o enforcamento. Algumas mensagens finais dos condenados são abafadas pela multidão expectante, mas animada. E um deles, já com a corda ao pescoço, afirma reconhecer na plateia gente bem pior do que ele. Não duvidamos.
O que o Marshal Jed Cooper vem a descobrir, ele que foi vítima da pior das injustiças, é o que o juiz Fenton pretende disfarçar. Não há justiça onde apenas reside um mórbido desejo de vingança. A inclemência do juiz, assistindo às execuções de um lugar privilegiado, surge-nos assim tão ou mais criminosa do que os crimes cometidos por alguns daqueles condenados, como os dois jovens que Jed Cooper tenta absolver depondo em seu favor. É o próprio Jed Cooper quem perdoa um dos seus executores, reconhecendo nele uma inocência que a lei cega do juiz Fenton não quer ver. E quando toma conhecimento dos fantasmas que perseguem Rachel (Inger Stevens), a misteriosa mulher que espreita cada um dos prisioneiros chegados à cidade, ele questiona-se: e se nunca chegarmos a encontrar os nossos fantasmas?
Panfleto contra a pena de morte ou não, este filme tem o mérito de nos fazer pensar alguns dos mais repetidos lugares-comuns sobre o desinteresse da lei e a “cegueira” da justiça. Impressionante que se mantenha tão actual.

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