sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

«ESSA ARANHA GEOMETRIFICA SEUS CAPRICHOS NA IDEIA DESSA TEIA: EMARANHA A MÁQUINA DE LINHAS E ESTÁ ESPERANDO QUE LHE CAIA ÀS CEGAS UM BICHO DENTRO: AÍ TRABALHA, AÍ CEIA, AÍ FOLGA.»

Calçada da Glória, Lisboa. 2012.

Não sou máquina, não sou bicho, sou René Descartes, com a graça de Deus. Ao inteirar-me disso, estarei inteiro. Fui eu que fiz esse mato: saiam dele, pontes, fontes e melhoramentos, périplos bugres e povoados batavos. Eu expendo Pensamentos e eu extendo a Extensão! Pretendo a Extensão pura, sem a escória de vossos corações, sem o mênstruo desses monstros, sem as fezes dessas reses, sem a besteira dessas teses, sem as bostas dessas bestas. Abaixo as metamorfoses desses bichos, - camaleões roubando a cor da pedra! Polvos no seco: no ovo, quem deu antes no outro, uma asa na linha do galho ou um pulo em busca de agasalho? Não sabem o que fazer de si, insetos pegam a forma da folha; mimeses. E a forma? Coisas da vida! Vinde a mim, geometrias, figuras perfeitas, - Platão, abri o curral de arquétipos e protótipos; Formas geométricas, investi com vossas arestas únicas, ângulos impossíveis, fios invisíveis a olho nu, contra a besteira dessas bestas, seus queixos barbados, corpos retorcidos, bicos embaraçosos de explicar, chifres atrapalhados por mutações, olhos em rodela de cebola! Vinde círculos contra tamanduás, quadrados por tucanos, losangos versos tatus, bem-vindos! Meu engenho contra esses engenhos! A sede que some fede que fome! Falta-me realidade.

Fotografia: Jorge Aguiar Oliveira
Texto: Paulo Leminski

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