domingo, 24 de agosto de 2014

BURROCRATAS

Descobri a palavra num poema de Herberto Helder publicado em Servidões (Maio de 2013):

esquivar-se à sintaxe e abusar do mundo,
oh como em pedra trançada ficou dito,
ígnea pedra até ao fim de tudo e mais que tudo isso infundido,
lá onde fresca e unânime a terra que respira:
ferida funda
— e sem nada a ver com tudo,
os burrocratas indizíveis

Na minha ignorância, julguei nova a palavra. Mas redescubro-a num poema de Fabiano Calixto publicado em 2006. Deixo um excerto:

os tijolos vermelhos lodosos
as casas pela metade
andaimes, latas de tinta vazias,
pedras, cimento, cal

enquanto os burrocratas
do pensamento
discutem mais-valia & idolatria
mercancia & democracia
lucracia & poesia
na sala de justiça
dos bem-nascidos
& rebocam sua vaidade & idiotia
na cara da geral,
outra poesia é feita
neste mundo
na universidade desconhecida
na vida sem fim
de quem chegou até aqui
derrubando, aos murros, o muro
moldando o mundo a muque

Entretanto a palavra tornou-se conceito que muita coisa abarca. Burrocratas: definição de um tempo sob o toldo da revolução tecnológica.

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