quarta-feira, 8 de outubro de 2014

QUANDO SOUBE, AO FIM DO DIA


Quando soube, ao fim do dia, que o meu nome tinha sido aplaudido no Capitólio, nem por isso me senti feliz nessa noite,
E mais ainda, quando me embriaguei ou quando se cumpriram os meus planos, não me senti feliz,
Mas no dia em que me levantei bem cedo de perfeita saúde, descansado, a cantar, aspirando o ar amadurecido do Outono,
Quando a ocidente vi a lua cheia empalidecer e desaparecer com a luz da manhã,
Quando vagueei só pela praia, e nu entrei na água, rindo com as águas frias, e vi o Sol nascer,
E quando pensei que o meu querido amigo, o meu amante, vinha a caminho, oh, então senti-me feliz,
Oh, então, o ar que aspirava era mais fresco, e durante todo aquele dia o que comia satisfazia-me mais, e aquele belo dia foi maravilhoso,
E o dia seguinte surgiu com igual alegria, e no outro a seguir, à tarde, chegou o meu amigo,
E naquela noite, quando tudo estava em silêncio, ouvi o rolar lento e contínuo das águas invadindo as praias,
Ouvi o murmúrio sibilante desse líquido e das areias, como se em murmúrios me felicitassem,
Pois aquele que mais amo dormia junto de mim sob a mesma manta na noite fria,
No silêncio dos raios da Lua de Outono, o seu rosto inclinava-se para mim,
E o seu braço repousava levemente sobre o meu peito — e nessa noite fui feliz.
 
 
Walt Whitman, in Folhas de Erva, trad. Maria de Lourdes Guimarães, Círculo de Leitores, Fevereiro de 2006, p. 114.