Está tudo mais ou menos aqui, com sentido de humor e inteligência.
Mais uma vez, fica o registo da miséria em que estamos. A tacanhez de
pensamento era provável, mas constatá-la assim tão de perto é medonho. Um Salazar
em cada ministério, ainda ontem tive que ouvir. Onde ir buscar esperança quando
se tem de lidar com tamanho idiotismo?
Em última instância, quem julga que os cartunistas do
Charlie Hebdo estavam a pedi-las também terá de aceitar, nem que seja no
mínimo dos mínimos, a validade da Santa Inquisição. Quero dizer: condenamos
a tortura e a pena de morte, mas conseguimos encontrar alguma razoabilidade ou compensação ou equilíbrio no assassinato dos jornalistas. Que equilíbrio haverá no extermínio das aldeias nigerianas? Talvez também esses tenham o que
estavam a pedir com a sua... infidelidade. Enfim, para estas pessoas que justificam actos terroristas Abu Ghraib foi um tribunal onde se
repôs a justiça no mundo. Meteram-se com os americanos? Ora tomem lá que é para
aprenderem. Os campos de concentração nazi? E os gulag da antiga União
Soviética? E a PIDE? E o Tarrafal? E Gaza? Quem manda a todas essas pessoas que foram
presas, torturadas, assassinadas nesses lugares de morte meterem-se com a
sensibilidade e as crenças mais profundas e íntimas dos ditadores? Nelson
Mandela estava a pedi-las quando foi preso. Ah pois estava. E Mahatma Gandhi,
tivesse ficado caladinho, jamais teria sido assassinado.
Há algo de positivo no
que aconteceu recentemente em Paris. A gente consegue sempre retirar algo positivo da maior das tragédias. Esta evidência cartesiana de estarmos
rodeados de cretinos que mais facilmente baixam as calças do que dão o peito às
balas. Não se trata de medo ou cobardia, é mesmo escolher o lugar em função das
conveniências. Chama-se oportunismo. Um oportunismo que, misturado com
ignorância e hipocrisia, dá nesta defesa do indefensável. Saberão estas pessoas
preocupadas com a sensibilidade e as convicções mais íntimas dos terroristas o
que esses tipos fazem às mulheres acusadas de adultério? Saberão do tratamento que se dá a
essas mulheres e aos homossexuais? Até sabem, mas não têm nada que ver com isso. Eles que se
entendam que nós por cá vamos bem. São mais putinistas que Putin, estes
indiferentes da pós-modernidade. Na Arábia Saudita andam a chicotear um blogger
porque insultou o islão. Chama-se o terrível herege Raef Badawi. Imaginemos
que por cá dávamos o mesmo tratamento a quem, dos nossos, insultasse o
catolicismo. Mil chibatadas no cartunista António por ter posto um preservativo
no nariz do Papa. Chega? Ou matamo-lo com uma bala na nuca?
P.S.: Um texto a ler, do Lourenço Bray: aqui.
P.P.S.: E na revista Visão a notícia parece hilariante: "a polícia religiosa do Estado Islâmico foi filmada a bater em músicos e a destruir os seus instrumentos como castigo após terem sido descobertos a tocar um teclado não islâmico". Mas estes tipos merecem algum respeito?
P.P.S.: E na revista Visão a notícia parece hilariante: "a polícia religiosa do Estado Islâmico foi filmada a bater em músicos e a destruir os seus instrumentos como castigo após terem sido descobertos a tocar um teclado não islâmico". Mas estes tipos merecem algum respeito?
2 comentários:
Serias o primeiro a ser chicoteado (em nome da razão e da verdade).
epá, exactamente o que sinto.
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