Ainda antes de ter garantido um lugar na história do cinema
pelo desempenho no popular Shane (1953), Alan Ladd conseguiu afirmar-se como
actor noutros filmes do género. A sua presença em Whispering Smith/A Vida Por
Um Fio (1949) não passa despercebida, ainda que ao realizador Leslie Fenton (n.
1902 – m. 1978) pouco mais tenha sido reservado do que um lugar secundaríssimo
no corredor da fama. Todavia, Fenton, que nos primeiros anos de carreira fora
actor, sabia oferecer aos seus pares papéis marcantes. Whispering Smith releva
essa característica com um elenco nada desprezível, onde aparecem Donald Crisp
— oscarizado pelo trabalho memorável em How Green Was My Valley/O Vale Era
Verde (1941) —, o enérgico Robert Preston — nomeado para um Oscar pela aparição
no musical Victor Victoria (1982), se bem que mais conhecido pelas presenças em
The Last Frontier/Os Bravos Não Voltam Costas (1955), de Anthony Mann, ou How
the West Was Won/A Conquista do Oeste (1962) —, e a belíssima Brenda Marshall, uma
filipina de nome completo Ardis Ankerson Gaines que tem neste filme uma das
suas derradeiras aparições no grande ecrã. Merecia melhor sorte:
Os talentos de Ladd, Preston, Marshall e Crisp formam um
quadrado dentro do qual se desenrola uma acção de contornos trágicos cujas fragilidades que Fenton foram superadas apostando-se tudo no desempenho dos actores. Disto são
testemunho inúmeros enquadramentos que isolam as suas personagens procurando
fazer sobressair gestos, movimentos, posturas, esgares, onde a narrativa
adquire uma expressividade que transcende o plano da acção. Whispering Smith
envia-nos para o território clássico dos assaltos a comboios, mas sem aquele
tipo de sequências que sobrevive da improbabilidade dos feitos. Reconheça-se
que nos momentos em que o imaginário circense poderia fazer valer audiências, Leslie
Fenton protege os actores de quedas e de arranhões preenchendo o cenário com planos
relâmpago onde se sugerem descarrilamentos, travagens bruscas, explosões. Não é,
pois, um objecto de excessivos efeitos especiais. O interesse recai antes sobre
a história, algo que pode ser pouco para cinema mas de algum modo desvia este
western das tácticas mais banais de entretenimento. Ou seja, há nesta obra uma encenação da emotividade que atrai o olhar e foca a atenção nos
sentimentos permutados entre as personagens. Alan Ladd é Whispering Smith,
competente e implacável zelador ao serviço da companhia ferroviária. No
decorrer de uma perseguição, volta a cruzar-se com o seu amigo de infância Murray
Sinclair (Robert Preston). Sinclair tem como função limpar a ferrovia sempre
que há um "acidente". Casou com Marian (Brenda Marshall), por quem Smith
reserva uma antiga e oculta paixão. Donald Crisp interpreta o papel de Barney
Rebstock, dono de um rancho que, na realidade, é uma máquina de lavar dinheiro
proveniente de assaltos aos comboios. Circunstâncias diversas levam a que
Rebstock alicie Sinclair para a sua coutada, deixando Smith na delicada situação
de ter que confrontar um amigo de infância. Sem ser profundo na abordagem da
questão moral, Leslie Fenton consegue emocionar-nos com algumas sequências que
opõem o ciúme à amizade, esta ao dever, o dever à paixão. No final, Smith diz
que jogou com as cartas que lhe foram dadas por Sinclair. Não tinha outras. Mas
será mesmo assim? Pode ou deve a máquina das obrigações profissionais
sobrepor-se ao valor da amizade? É uma questão pertinente, para a qual jamais
teremos resposta. O que Whispering Smith nos mostra é que as relações de
amizade não se regem por leis puramente racionais, revelando-se frágeis e débeis
quando iluminadas pela lógica. Alan Ladd encarna um herói que não é pacífico,
um herói que de certa forma pressagia o Henry Fonda de Once Upon a Time in the West.
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