A obra de arte é um espectáculo onde agem diferentemente o artista e o público. O que é passado do primeiro deve poder ser sempre o presente do segundo. Isto exige, além duma verdade emocional sem entraves, uma expressão sensível controlada.
Não há criação artística independente da forma. Esta deve ser para o conteúdo ó «único» veículo de comunicação, quere dizer: a obra de arte deve ser intraduzível por outros meios que não sejam aqueles de que se serviu o artista.
A arte não é um ideal humano. Afirmá-lo é desconhecer a realidade dolorosa da sua exigente humanidade. Também não é uma atitude preconcebida. Também não é um divertimento estético. Também não é um afinamento do vulgar. Também não é uma vulgarização do sublime. Não é também uma sublimação do humano. Sublime ou humana ou vulgar ou elegante, ela é apenas um estado de espírito particular que se caracteriza por um desejo «imperioso» de exteriorização objectivada.
Só a obra de arte interessa. Por ela, o caso individual, particular do artista, se transforma num caso social. Êsse o mistério que a sagra. O «estado de arte» não pode interessar senão pelos seus resultados na realização da «obra».
Não há cinco artes. A arte é uma palavra sem plural. A sua objectivação pode servir-se de todos os meios encontráveis. O que diferencia essencialmente as suas formas de expressão é a «atitude» do artista.
Poesia quere dizer: ritual exaltação sensível. Música quere dizer: ritual exaltação rítmica. Dança quere dizer: ritual exaltação corporal. Pintura quere dizer: ritual exaltação analítica. Escultura quere dizer: ritual exaltação formal. De resto, tudo isto não tem senão uma importância particular. «A arte é um rito mágico essencialmente humano, tocado de exaltação».
António Pedro, in Primeiro Volume - Canções e Outros Poemas / 1927-1935, Edições Revelação, Lisboa, 1936, pp. 21-24.
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