Nasci numa família de socialistas em terra de fascistas. À excepção da minha irmã mais crescida, que nasceu no Cartaxo, somos todos de Rio Maior. Sei o que é viver sob a sombra das mocas, fossem elas físicas ou psicológicas. Não esconder opções políticas neste país ainda é visto de esguelha. Ao contrário do que se diz, a nossa democracia ainda não é verdadeiramente democrática. Aprendi cedo a lidar com preconceitos, pelo que me obriguei a estudar, a pensar, a não recusar hipóteses nem possibilidades. A paixão pela filosofia fez o resto. Quando resolvi aceitar o Programa e os Estatutos do PCP, aderindo ao partido, fi-lo conscientemente. Ou seja, fi-lo em idade madura. Consciente da história do comunismo e do PCP. Há um tipo de argumentação anti-comunista que nunca aceitei, uma argumentação epidérmica e precipitada. Pressupõe-se que um comunista não deva ser comunista exactamente pela mesma razão que um católico não deva ser católico, na medida em que ambos os lados carregam contas negríssimas na sua história. Estamos todos conscientes dessas contas. Para não ir mais longe, espero que um democrata liberal saiba o que foi a invasão do Iraque apoiada pelo arrependido da Terceira Via Tony Blair, pelo maoísta arrependido Durão Barroso, pelo Bush filho, pelo coiso Aznar. Presumo que Abu Ghraib e Guantánamo não sejam estandartes desses fanáticos do capitalismo neo-liberal. E nesta caldeirada de presunções, espero que ninguém abandone convicções ideológicas porque sobre essas mesmas ideologias se ergueram edifícios tortos. Uma ideologia é um horizonte que nos inspira a caminhada. Não é um ponto de partida, é a possibilidade de um ponto de chegada. Tenho ouvido nos últimos tempos muita afirmação imponderada, desinformada, preconceituosa e anacrónica sobre o comunismo. Talvez algumas pessoas não percebam o que é ser-se comunista em 2015. Estou em crer que o PCP acabou de dar uma chapada de luva branca nessa gente, ao assumir compromissos históricos, até porque ninguém os julgaria possíveis, que têm em vista a reposição de direitos dos trabalhadores, dos pensionistas e dos funcionários públicos, saqueados nos últimos quatro anos por um governo de intrujões subjugados aos interesses germânicos. Este é o meu PCP. Aconteça o que acontecer, pela parte que me toca já valeu a pena. Acabei de receber uma mensagem do meu pai que me faz sentir isso mesmo. A esquerda portuguesa aprendeu finalmente a conversar. Preparem-se para o ruído, o maior virá de fora. Dos brutos da União que convivem sem incómodo com os muros da Hungria, mas que se perturbam estrondosamente com a possibilidade de uma Europa mais solidária, justa e equilibrada.
Adenda: acordo disponibilizado integralmente aqui.
4 comentários:
Concordo contigo, Henrique.
Senti algumas coisas que escreveste na cidade onde agora vives (mesmo sem as mocas).
Nunca percebi a mania que as pessoas têm de mostrar aquilo que não são, muito menos o facto de o carro de marca ou a casa apalaçada fossem o objectivo da vida...
Junta saloice à hipocrisia, mete umas pitadas de vaidade estúpida, condimenta com facciosismo parolo e tens o cocktail perfeito. :-)
Ah!, como entendo o que falas! Eu que não me lembro de ter tido infância e a quem a juventude foi roubada. Eu que não quero ser católica, mas que me dou conta de possuir uma imensa fé no trabalho agora realizado. À esquerda! Finalmente!
Estou contigo. Só o que já foi feito, já valeu a pena!
MF
É isso aí, irmã. :-)
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