sábado, 27 de fevereiro de 2016

[PUTAS]



Caem nelas como buracos no dia,

arregaçam o pêlo, chegam-lhes fodidos
mamam-lhes as tetas, gritam de bestas

o caralho teso espetado nelas, e se riem
coram de pavor, e depois sentem desgosto

vão-lhes ao cu, fodem de arremesso
a memória delas no fedor dos camaradas,

a pele nua esmagada de chumbo

e vomitam curtos, esporram delas
como água das mães,

vozeados no corpo, tristonhos
ficam de narinas consumidas, os dedos afilados

a carcela aberta no cheiro das conas.

Existem deles com o osso preso à roupa
a prega aflita na blusa, a boca escanzelada

elas rasas deitadas nos colchões

roubam-nos aos pares, se os abraçam
deixam-nos morrer, eles calmos nos lençóis

depois soltos, abrem-lhes as fuças,
ficam nelas a chorar, pedem-lhes colo
enrolados como filhos findos

as mamas inchadas de sangue
encostadas ao corpo deles,

as mãos desmazeladas nos pulsos
onde desmancham os cabelos.

Deitam o odor contra a parede,
iminentes delas em raiva que perdessem

os corpos vão por elas como golpes
a cama desmedida à cor do sémen,

o colo em sangue, o véu desfeito

têm os dias sobre a profusão do corpo
são vestidas magras a fio e eito,

trazem o nome deles no ventre
porcas, desinfestadas às esquinas

os cabelos desgrenhados de doença
raiva que as vem esperar às camas,

preparam o parto ligeiras na praga,
escorrem miudezas de mulher

fracturam o corpo nas águas,
caídas como ramos nos rios.



Alexandre Nave (n. 1969), in Vão Cães Acesos pela Noite (2006)Dois livros publicados no início deste século, Columbários & Sangradouros (2003), Vão Cães Acesos pela Noite (2006), permitiram a Alexandre Nave afirmar-se como uma das vozes mais promissoras da poesia portuguesa contemporânea. Pelos impulsos expressivos, pelo culto de imagens eminentemente carnais, pela índole metafórica de uma linguagem visceral, Luís Miguel Nava seria talvez o poeta com o qual melhor dialogaria esta poesia. Mas se neste havia uma discursividade narrativa, nos poemas de Nave essa discursividade é desconstruída por uma sintaxe onde cada verso insinua rajadas violentas e impetuosas de um complexo lexical despudoradamente hostil. Certas imagens remetem para um homoerotismo que facilmente associaríamos a autores como Pasolini ou Genet, embora o eco de Céline se faça ouvir amiúde por entre paisagens que exprimem uma dimensão sombria e vertiginosa da existência do indivíduo violado pela comunidade que o marginaliza.

1 comentário:

MJLF disse...

Olha o Alexandre ehehehehe! :)