quinta-feira, 30 de março de 2017

[Voltemos um pouco atrás]



Voltemos um pouco atrás
Surpreende-me a precisão
Com que adivinhas
Os desastres do paraíso
O quando e o quanto
Ao escrever não posso
Ou não deva vens
Haurir o distúrbio
Ao grande livro dos reversos
Que não darei a ler


Rui Baião (n. 1953), in Separata (1994). Um primeiro livro publicado em 1982, com o título Quiasma, fixou-o entre os autores de uma geração de algum modo retratada com a publicação da antologia Sião (1987), de que foi co-organizador com Paulo da Costa Domingos e Al Berto. Mantém desde a primeira hora uma inquestionável coerência no modo como alcança os imperativos do tempo, manifestados numa poesia onde a ruína, o declínio, o abandono, os escombros, surgem representados enquanto sinais históricos modeladores de uma evidente decadência cultural. Mais do que se circunscrever à paisagem urbana, a poesia de Rui Baião transcende os ambientes geográficos penetrando o âmbito ontológico da figura humana à medida que a fotografa com extremo naturalismo. A relação corpo/sombra é um tema recorrente, sujeito a representações violentas da morte a partir dos seus indicadores materiais. Fotografia respigada aqui.

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