Uma estranha aura paira sobre a personagem de Jett Rink
desde o início do filme. Mantém-se e acaba solitário desde o início, sempre na
sombra, à margem, observando os outros e manifestando, por breves instantes e
de modo peculiar, chispas de ressentimento e de inveja. Foi o último trabalho de James
Dean, precocemente desaparecido num acidente de viação a 30 de Setembro de 19 55. Quem
com ele contracenou em Giant/O Gigante (1956) aponta-lhe traços de carácter
similares aos da sua personagem, compreensivelmente suavizados com recurso à sugestão
de um exaustivo trabalho de actor que supostamente Dean nunca abandonava. Neste
filme, valeu-lhe nomeação para os Oscars. Mérito dividido com Rock Hudson, que
no mesmo filme consegue ombrear com Dean na categoria de Best Actor in a
Leading Role. Apesar das inúmeras nomeações (mais de uma dúzia) o único a levar
a estatueta para casa foi o realizador George Stevens (n. 1904 – m. 1975), que
antes deste tinha assinado um dos mais icónicos westerns de todos os tempos:
Shane (1953), com Alan Ladd no papel principal.
Giant é um western cuja acção decorre após o
desaparecimento do Velho Oeste. Em bom rigor, devíamos chamar-lhe saga
familiar. Mas o ambiente texano, com Hudson no papel do rancheiro Bick,
confere-lhe a paisagem rude dos filmes de cowboys. Não é The Furies/Almas em Fúria (1950), de Anthony Mann, também uma saga familiar? E os temas estão lá,
desde a segregação racial, com os mexicanos a ocuparem o papel dos índios, até
às ameaças do progresso, com enormes bombas de petróleo a ocuparem uma
paisagem outrora dominada por incontáveis manadas de gado. Outro elemento absolutamente
central é o da presença feminina, desta feita no corpo de uma incrível
Elizabeth Taylor. Menina de boas famílias instaladas em Virgínia, desloca-se
para o Texas na sequência de uma paixão para a vida. Não sabe o que a espera,
mas começa a aperceber-se quando ao acordar durante a viagem de comboio
espreita pela janela e a paisagem arborizada deu lugar a um deserto empoeirado
e hostil. Tudo lhe será hostil nessa vasta e rude terra, a começar pela
cunhada: a enorme Mercedes McCambridge (como esquecê-la, era a mulher de negro
em Johnny Guitar), uma fugaz opositora de Leslie Benedict, já que é curto e
fatalista o seu papel. Ainda assim, valeu-lhe igualmente nomeação para os
Oscars.
Só não conseguimos entender a ausência de Liz Taylor
nesta lista. Ela é uma extraordinária ponte entre os extremos, uma diplomata congénita
capaz de levar a sua perspectiva avante sem abrir brechas insanáveis. É ela
quem garante a coesão familiar quando tudo parece colapsar, é ela que abre as
vias do diálogo entre o marido e o novo-rico Jett Rink, o isolado e desamparado
industrial do petróleo a quem Dean ofereceu corpo e alma. Elizabeth Taylor é a
mais gigantesca figura nesta história. Tudo o que acontece, todas as cenas,
todas as sequências, todos os planos, voltam-se para ela como se ela não
estivesse lá. Na figura frágil de uma jovem Leslie germina um dos exemplos mais
rigorosos da emancipação feminina que o cinema alguma vez nos ofereceu. As
décadas que o filme retrata obrigam a retirar-lhe o brilho sensual da
juventude, mas fortificam a atitude cativante de uma mãe e avó cujos princípios
e valores nunca se subsumiram no acessório.
Gigantesca é, deste modo, a figura da mulher numa história encenada a partir de um romance de Edna Ferber. O resto parece acessório,
ainda que não irrelevante, num elenco inacreditável que, além dos mencionados,
inclui um irreconhecível Dennis Hopper, a bela Carroll Baker de How the West Was Won/A Conquista do Oeste (1962), ou o malogrado Sal Mineo (n. 1939 –
m. 1976), a quem me referi aqui a propósito de filmes tais como Cheyenne Autumn
(1964) e Stranger on the Run (1967). Num mundo desenhado a régua e esquadro por
e para homens intrépidos e selvagens (não confundir com indígenas), a força
maior que o filme de George Stevens celebra é a da figura materna. Realizador especialmente
dado aos bons sentimentos, não foge da sua linha neste filme. Sem resvalar no
moralismo explícito, ele parece aqui pretender glorificar a devoção materna. Não
se saiu mal.
Assinalar apenas que este é mais um de muitos westerns
com banda sonora assinada por Dimitri Tiomkin.
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