segunda-feira, 24 de abril de 2017

GIANT (1956)


Uma estranha aura paira sobre a personagem de Jett Rink desde o início do filme. Mantém-se e acaba solitário desde o início, sempre na sombra, à margem, observando os outros e manifestando, por breves instantes e de modo peculiar, chispas de ressentimento e de inveja. Foi o último trabalho de James Dean, precocemente desaparecido num acidente de viação a 30 de Setembro de 1955. Quem com ele contracenou em Giant/O Gigante (1956) aponta-lhe traços de carácter similares aos da sua personagem, compreensivelmente suavizados com recurso à sugestão de um exaustivo trabalho de actor que supostamente Dean nunca abandonava. Neste filme, valeu-lhe nomeação para os Oscars. Mérito dividido com Rock Hudson, que no mesmo filme consegue ombrear com Dean na categoria de Best Actor in a Leading Role. Apesar das inúmeras nomeações (mais de uma dúzia) o único a levar a estatueta para casa foi o realizador George Stevens (n. 1904 – m. 1975), que antes deste tinha assinado um dos mais icónicos westerns de todos os tempos: Shane (1953), com Alan Ladd no papel principal.
Giant é um western cuja acção decorre após o desaparecimento do Velho Oeste. Em bom rigor, devíamos chamar-lhe saga familiar. Mas o ambiente texano, com Hudson no papel do rancheiro Bick, confere-lhe a paisagem rude dos filmes de cowboys. Não é The Furies/Almas em Fúria (1950), de Anthony Mann, também uma saga familiar? E os temas estão lá, desde a segregação racial, com os mexicanos a ocuparem o papel dos índios, até às ameaças do progresso, com enormes bombas de petróleo a ocuparem uma paisagem outrora dominada por incontáveis manadas de gado. Outro elemento absolutamente central é o da presença feminina, desta feita no corpo de uma incrível Elizabeth Taylor. Menina de boas famílias instaladas em Virgínia, desloca-se para o Texas na sequência de uma paixão para a vida. Não sabe o que a espera, mas começa a aperceber-se quando ao acordar durante a viagem de comboio espreita pela janela e a paisagem arborizada deu lugar a um deserto empoeirado e hostil. Tudo lhe será hostil nessa vasta e rude terra, a começar pela cunhada: a enorme Mercedes McCambridge (como esquecê-la, era a mulher de negro em Johnny Guitar), uma fugaz opositora de Leslie Benedict, já que é curto e fatalista o seu papel. Ainda assim, valeu-lhe igualmente nomeação para os Oscars.
Só não conseguimos entender a ausência de Liz Taylor nesta lista. Ela é uma extraordinária ponte entre os extremos, uma diplomata congénita capaz de levar a sua perspectiva avante sem abrir brechas insanáveis. É ela quem garante a coesão familiar quando tudo parece colapsar, é ela que abre as vias do diálogo entre o marido e o novo-rico Jett Rink, o isolado e desamparado industrial do petróleo a quem Dean ofereceu corpo e alma. Elizabeth Taylor é a mais gigantesca figura nesta história. Tudo o que acontece, todas as cenas, todas as sequências, todos os planos, voltam-se para ela como se ela não estivesse lá. Na figura frágil de uma jovem Leslie germina um dos exemplos mais rigorosos da emancipação feminina que o cinema alguma vez nos ofereceu. As décadas que o filme retrata obrigam a retirar-lhe o brilho sensual da juventude, mas fortificam a atitude cativante de uma mãe e avó cujos princípios e valores nunca se subsumiram no acessório.
Gigantesca é, deste modo, a figura da mulher numa história encenada a partir de um romance de Edna Ferber. O resto parece acessório, ainda que não irrelevante, num elenco inacreditável que, além dos mencionados, inclui um irreconhecível Dennis Hopper, a bela Carroll Baker de How the West Was Won/A Conquista do Oeste (1962), ou o malogrado Sal Mineo (n. 1939 – m. 1976), a quem me referi aqui a propósito de filmes tais como Cheyenne Autumn (1964) e Stranger on the Run (1967). Num mundo desenhado a régua e esquadro por e para homens intrépidos e selvagens (não confundir com indígenas), a força maior que o filme de George Stevens celebra é a da figura materna. Realizador especialmente dado aos bons sentimentos, não foge da sua linha neste filme. Sem resvalar no moralismo explícito, ele parece aqui pretender glorificar a devoção materna. Não se saiu mal.

Assinalar apenas que este é mais um de muitos westerns com banda sonora assinada por Dimitri Tiomkin. 

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