quinta-feira, 18 de maio de 2017

SEM QUEIXA

Terminada a leitura de O Jantar, fui acossado pelas imagens divulgadas no canal pasquim que tanta indignação geram de momento e momentaneamente (logo passa). Nem de propósito. Entre o que agora se mostra e o que outrora se mostrou, aquando do casal em pleno acto nas belas paisagens de Paredes de Coura, não há muito a acrescentar. É mais um caso de intolerável paparazzização do mundo. 
O mal está nos grunhos que filmam e se divertem a partilhar o que filmaram com a típica atitude de burgessos. Estão ao nível dos velhos rebarbados que frequentam dunas à cata de meninas em topless. A putativa violação (até ver, a jovem não apresentou queixa) não é o acto sexual em si, que nada indicia de especialmente novo. Lembram-se de Kids, o polémico filme de Larry Clark que em 1995 mostrava as coisas como elas eram? Pois bem, acrescentem-lhe agora os telemóveis e o culto da devassa. 
Acrescentem-lhe igualmente o jornalismo da mediocridade que pega nisto como quem espreme laranjas podres. Sai sumo podre imediatamente consumido e ampliado por redes sociais e afins. Faz tudo parte de um mesmo jogo em torno do sexo e dos excessos a ele aliados, num processo cada vez mais intensificador de falsos moralismos. É o que vende. 
Histórias de álcool e de sexo em queimas das fitas, com parceiros embrulhados por batinas ao relento, são tão banais quanto tremoços. Bêbados, disponíveis, fragilizados, porventura arrependidos no dia seguinte mais pelas dores da ressaca do que da consciência, os implicados são parte integrante de um universo que é o nosso. Não estamos a falar de alienígenas. Só que agora filma-se. 
A referência inicial ao livro do holandês Herman Koch não é por acaso. O plot mete ao barulho o filho adolescente de um candidato a primeiro-ministro e um seu primo que se divertem a humilhar vagabundos e sem-abrigo. Há um homicídio pelo meio, involuntário como sempre são nestes casos. Tudo filmado e registado nos telemóveis como um pôr do sol em tarde de Verão. Que grunhos são aqueles no autocarro do Porto? Que rapariga é aquela? De onde vêm? De onde saíram? Com que educação terão sido formados? Onde estão os pais? Terão feito o mesmo? E onde está a sociedade que os pariu e continua a gerar outros como eles? Está a fazer os seus próprios vídeos, aposto.

1 comentário:

Claudia Sousa Dias disse...

Quem viu o vídeo dizia que ela estava bêbada e que até chegou a perder a consciência...face a isto como é que ela pode sequer prestar um depoimento em condições.

Não percebo porque é que um crime naquelas circunstâncias não é um crime público.

E ela também pode estar a ser ameaçada ou coagida a não apresentar queixa.