A história
podia começar com um homem a construir uma ponte entre dois mundos, o do sonho
e o da realidade. Depois da ponte construída, o homem contrataria alguns capangas
para cobrarem taxa a quem pretendesse fazer a travessia. Até que um dia, vindos
da realidade a caminho do sonho, dois homens com uma manada de gado decidiriam
não pagar as taxas. Poderiam atravessar o rio sem passar pela ponte.
O caudal ia baixo, não haveria problema. Mas a história da John Rhodes Sturdy,
escritor sem história, é diferente. Complica o que poderia ser simples ou
simplificado, trabalho que o realizador Edwin L. Marin (n. 1899 – m. 1951) não
esteve para fazer. The Younger Brothers (1949), sobre a saga de dois irmãos ao
serviço do gangue liderado por Frank e Jesse James, é o seu western com melhor
cotação. Não foram poucos os que assinou, sempre com pequenos orçamentos e
engenho desigual. Entre os restantes, são de sublinhar aqueles em que dirigiu o
actor Randolph Scott. Colt. 45 (1950), por exemplo, ou Fort Worth/Contra o
Crime (1951), o derradeiro dos seus filmes. The Cariboo Trail (1950) tem ainda um
outro aliciante, foi o último filme do carismático actor George ‘Gabby” Hayes
(n. 1885 – m. 1969).
São inúmeros os westerns em que participou nas décadas de
1930 e 1940. É ele, velho garimpeiro ao deus-dará, quem acolhe nas terras de
Cariboo dois temerários amigos com uma manada de gado, avisando-os, desde logo,
do perigo que ali corriam: gado e ouro não se misturam.
Cariboo foi durante
algum tempo um dos destinos eleitos por aventureiros assaltados pela febre do
ouro. A localidade de Carson Creek, no filme, poderá ser entendida como uma
referência a Williams Creek, a mais importante mina de ouro no interior da
British Columbia. Completamente dominada e controlada por um arrivista da pior
espécie, de seu nome Frank Walsh, Carson Creek será o cenário de uma acção
onde, como manda a tradição, os sonhadores farão oposição ao establishment. Vindos
do Montana, dois jovens amigos transportam gado para Cariboo com os olhos
postos também na possibilidade do ouro. Os problemas começam a surgir quando,
ao atravessarem a ponte sem pagarem o que lhes estava a ser cobrado, são alvo
de uma emboscada e perdem o gado. Além disso, um deles perde também um braço. A
partir daqui, os dois prosseguirão separados com um deles a tentar restabelecer
a amizade perdida. O que só acontecerá, como é óbvio, na sequência final. Pelo
meio há ainda algumas sequências bastante estilizadas que metem confrontos com
indígenas da nação Blackfoot (ou Blackfeet, se preferirem), os índios que
durante séculos habitaram a British Columbia. Numa das cenas mais apalermadas
da história do western, três brancos são salvos da execução por um burro aos
coices a uma tribo indígena. A imaginação não tem limites.
The Cariboo Trail nada
tem que ver com outros westerns que sabiamente enalteceram os esforços dos
pioneiros na conquista de rotas comerciais, transportando gado por percursos
agrestes e longos, longe de casa durante semanas, meses, dando força e realismo
ao mito do velho cowboy. Entre esses, o melhor de todos os westerns é Red River
(1948), com realização do enorme Howard Hawks (n. 1896 – m. 1977). Não ficaria
bem exigir a Edwin L. Marin o mesmo talento ou até a mesma ambição. Cinematograficamente,
o valor de um filme como The Cariboo Trail só pode ser avaliado enquanto peça
de entretenimento. A exaltação dos mitos norte-americanos, a estilização do
inimigo, o traço épico conferido aos heróis, enquanto conquistadores de uma
paisagem selvagem, é inerente a uma narrativa que não estaria tão preocupada
com a verdade como estaria em agradar a um público desejoso de se ver
engradecido pela maior das suas artes. Os maus também fazem parte desta
história, mas acabam sempre mal. Mesmo quando morrem ao lado dos bons e em
circunstâncias similares, deles lembrar-nos-emos apenas conquanto sirvam para
enaltecer a generosidade do lado bom da história. Não fugindo minimamente aos
clichés, Edwin L. Marin deverá ser lembrado como um dos seus mestres.
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