sexta-feira, 30 de novembro de 2018

O LIXO


Levo o lixo para a rua
embrulhado em papel e cuidado.
Ficam ali misturadas as sobras da vida,
cascas do tempo e recortes da alma.
Com tristeza as deixo no passeio
por serem restos de fruta, de comida,
e de literatura
com os quais
alguém se presumiu vivo ou creu existente.
E também porque, porventura sem que o saibamos,
alguém nos embrulhou
com papéis de céu, com nuvens de cuidado
e estamos na ponta do universo
e ninguém se despede de nós.
Levo o lixo para a rua, deixo-o no passeio,
e digo-lhe: Adeus.

Jorge Calvetti, versão de HMBF a partir do original coligido por Marta Ferrari, in Antología – La Poesía del siglo XX en Argentina, vol. 7 da colecção La Estafeta del Viento, dirigida por Luis García Montero e Jesús García Sánchez, Visor Libros, 2010, p. 89.

4 comentários:

Anónimo disse...

Já agora... Obrigado pelos poemas do Calvetti. Já o exercício de comparação do qual o poema da Golghona foi objeto, não é que seja escusado, porque isso não é, a questão é que foi pouco elaborado. Assim o Henrique escancarou as portas para o que, suponho, nem sequer desejava... e muito menos para si. Falamos da Golghona, mas vale para este e para aquele, para o outro e ao aqueloutro...

Anónimo disse...

outras cuspo nelas três vezes como um velho soldado

Diogo Vaz Pinto


cuspir três vezes nas mãos como um velho soldado

Georg Heym, poeta



"ar decapitado"


Neste rosto fixo de vidro que me serve
de reflexo, sorrio do meu ar decapitado
entre cabeças que roçam outras estrelas,

Diogo Vaz Pinto



Esta cabeça evanescente e aguda,
tão doce no seu ar decapitado,
do Império portentoso nada tem:

Jorge de Sena



"O Capitão do Fim"

inventa ruas e te empurra para debaixo
das arcadas, onde os capitães do fim
compõem o papelão e reerguem o seu
hotel de grilos e constelações.

Diogo Vaz Pinto



Jaz aqui, na pequena praia extrema,
O Capitão do Fim. Dobrado o Assombro,
O mar é o mesmo: já ninguém o tema!
Atlas, mostra alto o mundo no seu ombro.

Fernando Pessoa



"soluço obscuro"


Levar depois altíssima a cabeça entre
a vertigem dos ombros, o cigarro ou esse
soluço obscuro de quem segue até ao
último astro.

Diogo Vaz Pinto



sou eu que te abro pela boca,
boca com boca,
metido em ti o sopro até raiar-te a cara,
até que o meu soluço obscuro te cruze toda

Herberto Helder



"vastas terras como a insónia"


A noite estende, por fim, o braço ponteado
de cicatrizes luminosas, mapa das
minhas tristes capitanias, terras vastas
como a insónia.

Diogo Vaz Pinto



A luz devasta as alturas
Manadas de impérios derrotados
O olho retrocede cercado de reflexos
Vastas terras como a insónia

Octavio Paz

Anónimo disse...

http://universosdesfeitos-insonia.blogspot.com/2017/02/91.html
"Bandas como os Nirvana ou os Pearl Jam dominavam o panorama, desbravando caminho para um recrudescimento do rock que em breve teria no álbum de estreia dos Radiohead fortes motivos para acreditar ser possível não esvaziar de conteúdo emocional a música de massas."

Lights on! Ready?
www.youtube.com/watch?v=CxKWTzr-k6s
www.youtube.com/watch?v=IZBlqcbpmxY

Anónimo disse...

conclusão: na poesia não há in dubio pro poeta.