domingo, 10 de novembro de 2019

VIDA DUPLA

...Bernard Lahire. Sustentou o francês que a vida dupla do escritor «é mesmo plurissecular e estrutural», mas será essencial e benéfica? «Para quem», dispara de imediato [Patrícia] Portela, «Numa época em que trabalhar a tempo inteiro não compensa nem financeiramente, nem ecologicamente, nem socialmente, nem mentalmente, nem economicamente, para a família ou para o mundo, pergunto-me de que raio de benefícios ou de essências estamos a falar. Uma coisa é termos todos vida dupla, sermos escritores e biólogos, sermos escritores e jornalistas, sermos escritores e cozinheiros porque gostamos de ambas as profissões, porque precisamos delas, porque a nossa vida é feita e se alimenta de mundos diferentes. Outra coisa é aceitar o que quer que seja para pagar as contas ao fim do mês, ser humilhado oito horas por dia para contribuir para uma empresa ou serviço que em nada contribui para o bem-estar de quem trabalha. A plurissecular e estrutural vida dupla dos escritores é interessante quando uma alimenta a outra, não quando uma penaliza a outra.»

Inês Fonseca Santos, in Vale a pena? Conversas com escritores, Fundação Francisco Manuel dos Santos, Abril de 2017, p. 73

2 comentários:

João Moita disse...

Claro, porque só as luminárias que escrevem têm "o direito de se furtar ao inferno" (Trakl)...

MJLF disse...

Pois claro, e os artistas visuais também têm vidas duplas, numa ganham dinheiro seja a dar aulas ou outro emprego pago, e na outra gastam dinheiro a fazer a sua arte ;)