Há muito de verdadeiro nas Histórias Falsas, de Gonçalo
M. Tavares, publicadas pela primeira vez em 2005, na Campo das Letras. São 9
contos que recuperam personagens históricas, mormente do universo da filosofia
clássica, apropriando-se de mitos e lendas a elas associadas, misturando-as e
baralhando-as sem grande preocupação com os factos em si. O princípio
filosófico é o do exemplo, da analogia, da parábola. Imaginemos que… E daqui se
parte para uma especulação que tem tanto de poético como de filosófico, tem
tanto de ficção como de realidade, tem tanto de falso como de verdadeiro,
subvertendo a lógica de que uma coisa não pode ser e não ser ao mesmo tempo.
Logo na segunda, a que recebe Tales de Mileto como protagonista, ao lado de uma
criada chamada Lianor. A certa altura damos com esta divagação:
(…) Dos filósofos e dos poetas sabe-se pouco; no entanto,
uma certeza: não são como os outros; não mudam.
Se Procrustes, o
bandido de Ática, que depois de roubar os viajantes, os deitava numa cama de
ferro, cortando-lhes os pés se estes fossem mais compridos que a cama, e
esticando-os com cordas, no caso de serem mais pequenos; se, dizíamos,
Procrustes, o bandido de Ática, aprisionasse um sábio ou um poeta, não teria
dificuldade em transformar-lhes o corpo de acordo com as medidas da sua
violência, mas o que jamais conseguiria era normalizar-lhes ideias, ou a
vontade.
(…)
Gonçalo M. Tavares, in Histórias Falsas, Leya, 2.ª edição
BIS, Setembro de 2011, pp. 22-23.
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