Havia a situação do indivíduo que saía para beber uns copos à
noite e acabava na cama com um travesti. A semiótica do engate exige agora
outra sofisticação. Por detrás de uma máscara muita coisa pode ser escondida. À
pergunta “o que mais aprecias numa mulher ou num homem”, temo o desaparecimento
das tradicionais respostas olhos, mãos, pernas, cu, mamas. As pessoas estão a
redescobrir a relevância do nariz e da boca, isto é positivo. O lado negativo é
a drástica redução percentual de probabilidades na sedução de mercearia ou supermercado.
Quem tiver visto “Lua de Mel, Lua de Fel”, de Roman Polanski, sabe do que estou
a falar. Quem não tiver visto, veja. Mais que não seja pela Emmanuelle Seigner,
que é daquelas a quem, à época, com máscara ou sem máscara tudo ficava bem. Nem
tudo irá ficar bem, já sabemos. Uma das coisas que não ficará nada bem é este
novo exercício de adivinhar a linguagem do olhar. Estará a sorrir? Estará
zangada? Estará triste? E com os vesgos, como será? Tento aquietar o espírito convencendo-me
de que quem vê caras não vê coração, isto é, quem não vê caras também não vê
corações. Portanto, o meu foco irá todo para aquela parte do peito onde Deus
Nosso Senhor incrustou a bomba de sangue que nos anima. Espero não me distrair
com os decotes.
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