Esta imagem tem sido muito partilhada a propósito das manifestações de ontem. Também eu a vou partilhar, mas por razões diferentes do que tenho constatado. Por onde a fui encontrando levantei algumas questões: Quem é este rapaz? Quem tirou a foto? Em que circunstâncias? Alguém na manifestação onde parece ter estado o indagou sobre a mensagem estúpida do cartaz? Quem pôs a foto a circular? Com que intenção?
São perguntas legítimas e obrigatórias, creio, no mundo de contrainformação em que vivemos, um mundo onde supremacistas brancos se fazem passar por elementos do Antifa para provocarem distúrbios e desacreditarem reivindicações justas. Reparem bem na foto, reparem na pessoa que por detrás do braço do indivíduo fotografado olha, aparentemente, para quem está a tirar a fotografia. Tudo parece uma encenação. E pode não ser.
Em sendo, não causa espanto senão pela popularidade que atinge junto até de quem supomos inteligente o suficiente para a não divulgar sem as dúvidas acima transcritas.
Em não sendo, é um cartaz isolado entre inúmeros cujas mensagens legítimas, urgentes e inteligentes parecem não ter a mesma força que o inusitado da ignorância exibido neste slogan.
Eis o mundo em que vivemos: um cartaz estúpido sozinho pode destruir uma manifestação pertinente, tal como as imagens de um indivíduo a ser executado pela polícia podem mobilizar massas que se mantiveram silenciosas face a variadíssimos outros crimes e abusos semelhantes perpetrados entre quatro paredes. Perante este poder da imagem, é determinante que as nossas escolas insistam não só na interpretação de texto e na resolução de teoremas, mas adoptem nos currículos metodologias de interpretação... de uma imagem.
3 comentários:
bem, quando vi pareceu-me "falsa", "manipulada", "fake news" como agora se diz.
Sendo "verdadeira", isto é, tendo o rapaz em questão efectivamente levantado o cartaz com os respectivos dizeres, isto, por incrível que pareça, não faz com que a uma imagem "verdadeira" seja de facto verdadeira, pode muito bem continuar a ser falsa.
logo, a minha primeira impressão está correcta. a imagem é "falsa".
https://www.publico.pt/2020/06/08/sociedade/noticia/sindicato-policias-vai-apresentar-queixa-devido-mensagens-incentivam-odio-1919813
Na notícia do Público mostram, parece, um cartaz diferente com a mesma mensagem. Curiosamente, sendo um branco a empunhá-lo, decidem pôr um preto a ilustrar a notícia. Dou de barato que sem nenhuma segunda intenção, mas põem-se a jeito de permitir uma segunda leitura. É, como dizes, um cartaz isolado que vincula apenas quem o exibe e só para quem já tem essa opinião à partida tira pertinência à manifestação (e a saúde, pá? Sem ironia). Tomara nós que houvesse um, só um, lugar/partido/clube/religião/facção ideológica no mundo onde não existisse um único idiota.
Há fortíssimas hipóteses de ser real, não discuto isso. Até acredito que seja, pois tenho visto disto e pior em inúmeras manifestações. Há muito que me habituei a ouvir dizer "comuna bom é comuna morto". Fazer o quê? A minha questão é sobre o modo como nos posicionamos face às imagens e a mensagens isoladas. Quantos cartazes havia na manifestação em causa? Por que razão aquele cartaz estúpido há-de ser representativo de uma manifestação onde estavam milhares de cartazes inteligentes? A lógica do racismo é exactamente a mesma, generalizar, estereotipar, fazer uso do preconceito enquanto conceito.
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