Em carta a Alexandre Pinheiro Torres, datada de 1958, Jorge de Sena desculpa-se por não ter incluído a mulher daquele nas “Líricas Portuguesas” (3.ª série): «Eu não incluí a Sua Esposa na antologia. Por forma alguma a considero destituída de mérito, e há na antologia uma meia dúzia de poetas (ou mais…) que, em minha opinião, lhe são inferiores». Segue-se a explanação do método e da contabilidade que deixaram Leonor de Almeida de fora. Já antes, agradecendo a intenção de Pinheiro Torres escrever sobre a sua obra, Jorge de Sena convida-o a integrar a antologia dando conta da tal contabilidade. A uma primeira lista de nomes pediu sugestões sobre ausências. Vários foram os que sugeriram Pinheiro Torres. «Referiu-o também o Amaro, mas esse referia “tout le monde et son père”», diz Jorge de Sena. Portanto, Pinheiro Torres entrou nas “Líricas” e a “Sua Esposa” ficou de fora. No entanto, o apontamento sobre Luís Amaro é o que tem mais graça. A “Esposa” ficou de fora porque não teve tantos votos, ainda que, presumimos, tenha contado com o voto do bom e generoso Amaro. Lembrei-me logo de uma carta de Sophia a Jorge de Sena, em que se refere a Alexandre O’Neill nos seguintes termos: «Mas como o O’Neill é fraco talvez mude de opinião quando lhe convier!» Estas avaliações do carácter de terceiros na República das Letras, a expressão é do autor de “Sinais de Fogo”, é altamente pedagógica, revelam mais sobre quem as profere do que sobre os visados. Assim temos que o mesmo O’Neill fraco, em carta a Pinheiro Torres datada de 1952, se refere ao (ex-)camarada Cesariny nestes modos: «Ignorava a calúniazeca do Cesariny — mas não resisto a chamar-lhe pela primeira vez um evidente filho da puta». Isto deu-me uma ideia para 2021, compilar em dossiers resistentes a naufrágios as centenas de e-mails que fui recebendo ao longo dos últimos 17 anos (desde que comecei a escrever sobre livros em weblogs). Ainda hei-de fazer mealheiro à conta dessas horas de tédio.
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