terça-feira, 19 de janeiro de 2021

HIS BLOOD’S IN ME (1999)


 

Que haverá de ti no meu sangue? Arrisco a hipótese hereditária, mas logo se impõe a ideia de que as circunstâncias desenham a coluna. As tuas foram mais agrestes, reconheço. Os cientistas têm percentagens para estas coisas. Olhando para o nosso caso, diria que nada de vocação, um cibo de valores e talvez mais do que possa parecer daquela timidez a que alguns chamam complexo de inferioridade por serem heróis e nunca haverem experimentado a acidez e a injustiça e o opróbrio da soberba a perfurar os pés como um ferro enferrujado. Vem de longe. Crescer pobre em terra de porcos incube frustrações, um ódio que se enterra na lama sem vontade de vingança.  Acerca de valores, assumamos pouco mais do que uma carcaça de intolerância ao erro que eu aprendi a mastigar mais para te incomodar do que para me resolver. Chamar-se-á o quê a isto? Obstinação? Nunca te perguntei o que pensarás de mim, que julgarás das opções que tomei na vida ou das que fui levado a tomar por me deixar levar pela corrente de paixões momentâneas. É assim e só damos por isso quando, já em alto mar, temos de esbracejar em busca de um pouco de terra onde possamos voltar a sentir-nos verticais. A verdade é que, por vezes, gostava de poder perguntar-te se já ouviste o álbum do Eric Mingus, mas noutras ocasiões dou graças a Deus por nem sequer fazeres ideia do que a música possa ser.

Sem comentários: