segunda-feira, 29 de novembro de 2021

QUERIA ESCREVER CINTO

 
Queria escrever cinto e saiu-me sinto
Ficaram os sentidos apertados
na barriga gorda do texto
e as emoções numa digestão contraída
espartilhadas pela gralha
piavam de vergonha
 
Acontece-me cada vez mais
Saltam-me letras das palavras
lapsos da língua afiada
o bico partido a meio da frase
como um desastre na auto-estrada
 
E estas rimas involuntárias
vindas não sei de onde
impõem-se para desgraça minha
Que fazer para deixar tudo limpo?
 
Há dias queria escrever povo e saiu ovo
Foi o p para a puta que o pariu
e ficou o povo em forma oval
a cair do cu de uma galinha
que o chocava em vão
 
Nem pinto nem gema nem clara
apenas uma casca que me saiu caca
e ficou para ali a cheirar mal como o mundo
 
Como o mundo? Com que boca?
Com que dentes? Ao fim e ao cabo
não como, não bebo, não mastigo
É-me tudo tão indigesto que prefiro
ficar pelo tempero
à espera que azede no próprio tacho

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