Entre o que não se vê, mas está lá, destacamos os
esquissos de Sara Miro, responsável pelos figurinos de “Na Cama com Ofélia”.
Muito invisível se esconde no visível. Bernardo Soares referia-se ao calor, no
“Livro do desassossego”, «como uma roupa invisível, dá vontade de o tirar». No
cartaz de José Serrão, Ofélia surge despida porque é assim que ela aparece,
verdadeiramente, em cena. Se por acaso assomar com algum trapo sobre o corpo é
para que se torne ainda mais evidente a vontade de tirar. No que diz está
completamente nua, porque o que diz revela aquilo que não se vê. Vem de dentro,
de um lugar indefinível, vem do pensamento — quem o vê? —, vem desse lugar a
que chamamos coração mas não é órgão, é já outra coisa, vem das vísceras, que
ela a certa altura confunde com a alma. Porque a alma não se vê, é o esquisso
por detrás das vísceras. Talvez “Na Cama com Ofélia” seja a anatomia de um
sonho, vontade que jaz numa promessa por cumprir. Falamos de vontade como
podíamos falar de desejo, aquela força que se esconde nas acções como um motor.
O público que decida se o que ela faz é sonho projectado ou acção concreta e
qual a diferença entre uma coisa e a outra. Para nós, o que importa sublinhar é
«que tudo isto é cómico, e que a parte mais cómica disto tudo sou eu.» Eu,
quem? A resposta a esta e outras perguntas, a partir do dia 17 de Fevereiro no
Teatro da Rainha.
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