sábado, 2 de abril de 2022

ROGEIRO, RODRIGO, MILHAZES & EU

Esta noite sonhei que era convidado do pivot Rodrigo no Jornal da Noite. Sentaram-me numa mesa ao lado do Milhazes e do Rogeiro, uma imensa mesa branca como a de Putin. Começou o Rogeiro a falar, depois do pivot Guedes lhe perguntar o que trazia para nos mostrar. Uma caixa, disse, trago uma simples caixa. Parece pomada para sapatos, mas não é. Na verdade, é caviar da melhor marca russa. Mas querem saber o melhor, perguntou. Eu disse que não queria saber, detesto caviar. Os meus interlocutores olharam-me com desprezo e pediram ao Nuno que por obséquio continuasse. Isto é um caviar que os russos andam a distribuir pelas populações famintas da Ucrânia, explicou, contaminado com uma salmonela criada em laboratório capaz de matar um urso em três tempos. Inacreditável, comentou o pivot de Carvalho, ao que se chega em tempos de guerra. Pobres ursos. Não te preocupes, disse o Rogeiro, não há notícia de que tenham morrido ursos e este caviar, na verdade, é só para exemplificar. E vai disto, meteu uma garfada na boca. Depois passou-o ao pivot que, por sua vez, fez a lata chegar ao Milhazes. E tu José, o que nos trazes? Olha, disse, trago algo que jamais me passaria pela cabeça trazer, uma garrafa de vodka ucraniano. Vodka ucraniano, perguntou espantado o pivot Rodrigo. E cai bem com caviar russo, rematou o Rogeiro naquele seu melhor ar inteligente de quem ri para dentro. É essa a intenção, explicou Milhazes, com um sorriso de orelha a orelha. Os ucranianos, continuou ele, andam a oferecer estas garrafas aos russos que entram na Ucrânia. Há já relatos de colunas militares paradas por causa deste vodka. Mas o que tem o vodka de especial, indagou o pivot. Prova só, sugeriu o Milhazes. E dão então início a uma prova de vodka em directo. Divinal, disse o pivot. Deveras inteligente, disse o Rogeiro. É um vodka mágico, mete os russos malucos, por isso é que não avançam nem recuam. Estão para ali parados. Quem também está muito parado é o nosso convidado, continuou o pivot, lançando um olhar ameaçador sobre a minha pessoa. E você o que nos traz? Bem, expliquei, não trouxe nada, não sabia que era para trazer comes e bebes. Comes e bebes, interrompeu o Rogeiro. Mas você pensa que nós estamos nas tasquinhas de Rio Maior, continuou o Milhazes. Não, nada disso, expliquei, simplesmente não sabia que era para trazer coisas, mas posso ler poemas. Tenho comigo o telemóvel. Poemas? Sim, poemas, por exemplo este da Anna Akhmátova, que até nasceu em Odessa. Um poema da Anna que nasceu em Odessa, perguntou incrédulo o pivot. Não seja desumano, censurou o Milhazes. Tenha vergonha na cara, sublinhou o Rogeiro. Agora poemas, repudiou o pivot. E continuaram em coro. Há pessoas a sofrer, percebe, pessoas e animais, já agora, e você traz para aqui poemas, não tem vergonha na cara, é insensível, sem qualquer empatia pelos mortos. Enquanto diziam estas coisas, iam emborcando o vodka e o caviar. Acordei com a Nala a lamber-me os pés.

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