A banalidade é o maior inimigo do aforismo, reflexão de portas entreabertas. Espreitá-la e sentir déjà vu é a sua condenação. De igual modo, esses versos lidos em que repercutem vozes alheias e distantes. Ao contrário do que lamentava Ruy Belo, nascer português não é necessariamente uma desvantagem. Afinal, ninguém quer saber de nós, ninguém nos liga. Os poetas portugueses estão, assim, em vantagem sobre os de outras nacionalidades, podem copiar o que se escreve lá fora, cortar e colar daqui e dacolá, que ninguém dará por nada. Nem os lá de fora, porque não nos lêem nem sequer sabem da nossa existência; nem os cá de dentro, porque não lêem os lá de fora nem os cá de dentro e, mesmo que lessem, jamais lhes passaria pela cabeça desmascarar o feito dizendo tão simplesmente: já li isto nalgum lado. “Como não ter lido isto e aquilo e aqueloutro em algum lado, pois se tudo já foi escrito?” Escudados em interrogações que carregam sentenças, os autoréus contornam a sua vulgaridade chamando atenção para o intertexo, a pretexto de culturas superiormente legitimadas pela universidade e o trabalho académico. Doutorados em falta de vida, turistas ocasionais num mundo que não querem nem ousariam descobrir, têm mais dos outros dentro de si do que têm de si mesmos. Sem darem por isso, transformam-se em cópias desinspiradas e tresmalhadas do que descobriram na The Paris Review. Se calha escutarem a voz de Kenny Hagood sobre a trompete de Miles Davis, desprovidos de emoção ou sentimento, abrem a boca para deixar entrar o mosquito do tédio e engolem-no em seco. Assim mesmo, sem mais. Depois cultivam tomate cereja na varanda lá de casa para se dizerem mestres em agricultura, amigos do campo e da ruralidade. Os tomates saem muito lindos, as saladas deliciosas, são verdadeiros fenómenos.
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