Entre os pré-socráticos, o mais entusiasmante de todos é
Zenão de Eleia. No entanto, pouco sabemos acerca desta misteriosa criatura.
Terá nascido em 490 a.C. (apoio-me no livro de Kirk, Raven e Schofield
publicado pela Gulbenkian). Diz-se também que conspirou contra um tirano, deu
provas de coragem ao ser torturado, passou a vida sem sair da sua cidade natal.
O que escreveu? Quando escreveu? Um tratado ou vários? O único fragmento da sua
autoria que nos chegou intacto diz isto: «Se existe um lugar, ele está em
alguma coisa, porque tudo o que existe está em alguma coisa; mas o que está em
alguma coisa está também num lugar; portanto o lugar deveria estar, ele próprio,
num lugar, e assim até ao infinito; portanto, não existe nenhum lugar.» (aqui
apoio-me na versão incluída na “História da Lógica” de Robert Blanché) O mais
que lhe foi atribuído chegou-nos, sobretudo, pelo que acerca dele se discute
nas obras de Platão e de Aristóteles. Este considerava-o «o inventor da dialéctica».
A discussão começa logo no que chamar aos pensamentos de Zenão: argumentos,
paradoxos, antinomias, dilemas, enigmas, quebra-cabeças? Por mim, podem
chamar-lhe o que bem entenderem. São desafios ao pensamento que colocam em
causa a resistência da lógica. Depois, com que intuito terá elaborado tais
aporias? Bertrand Russell, que se entusiasmou com elas, reconheceu a sua
capacidade de abalar aquilo que damos por verdadeiro. O problema da relação
espaço-tempo colocado pelos chamados paradoxos do movimento é, ainda hoje,
motivo de controvérsia. O que não parece gerar controvérsia é a relevância do
seu legado na história da literatura, nomeadamente em toda essa ficção
produzida sobre os alicerces do nonsense e do absurdo. O que seria de Lewis
Carroll ou de Samuel Beckett sem Zenão de Eleia?
Sem comentários:
Enviar um comentário